Jovem é executado dentro de ônibus
Após ameaça do ladrão, motorista seguiu viagem e só parou na capital
TÂMARA TEIXEIRA
FOTO: REPRODUÇÃO / FACEBOOK
João Gabriel e a namorada estavam juntos há cinco anos e faziam planos para se casar em breve
A estupidez de um ladrão irritado em tropeçar no pé de uma vítima. Esse pode ter sido o motivo para João Gabriel Camargos, 25, ter sido morto com um tiro na cabeça quando viajava com a namorada, Athena Chaves, 23. O ônibus em que eles estavam seguia de Poços de Caldas, no Sul do Estado, para Belo Horizonte, quando um dos passageiros anunciou o assalto na BR-381.
O casal e outras 38 pessoas saíram do interior às 23h de sexta-feira com previsão de chegada às 6h de ontem. Por volta das 2h, logo depois de uma parada na altura de Perdões, na região Centro-Oeste do Estado, a ação teve início.
Armado com um revólver, o bandido levou celulares, dinheiro, cartões de crédito e documentos de várias pessoas. Segundo os passageiros, durante a abordagem, ao se aproximar de João Gabriel, o homem teria tropeçado no pé do rapaz e se irritado.
Tiago da Silva Ribeiro, 22, estava dentro do veículo. Ele conta que o rapaz não reagiu. "Sem qualquer motivo, o bandido atirou. Depois de uns 20 minutos, ele ligou para alguém e avisou que estava descendo. Acho que o comparsa o buscou na rodovia", disse. O ladrão gritou que pertencia o Primeiro Comando da Capital (PCC), facção criminosa paulista.
Segundo o sargento Paulo Henrique Leite, o motorista do ônibus, que não teve o nome revelado, contou que o criminoso afirmou ter outros comparsas dentro do mesmo ônibus e atrás coletivo. El e ordenou que o veículo só parasse na capital. Com medo, o motorista não parou para pedir ajuda e socorrer a vítima. "Não havia mais ninguém. Ele disse isso só para intimidar as pessoas", contou o sargento.
Dor. Uma prima do jovem, a delegada Iara França Camargos, 29, disse que a família estava "destruída". "É uma circunstância muito fútil para se perder alguém. É difícil julgar as pessoas, mas fico pensando se não podiam ter socorrido ele", lamento.
A violência gratuita interrompeu a vida de um jovem cheio de sonhos. João Gabriel se formou há seis meses em engenharia química. Ele havia se mudado há poucos meses para trabalhar em Poços de Caldas. João Gabriel e Athena namoravam há cinco anos. Tinham planos de se casar.
A moça, também engenheira química, acabava de conseguir um emprego. Ela tinha ido visitar o namorado, e os dois vinham para a capital visitar as famílias. Ontem, dia da tragédia, era aniversário de Athena. Muito abalada, ela não conseguiu falar nada.
Depois de ver o namorado ser baleado, ela teve que viajar por cerca de duas horas com o rapaz sem vida no seu colo. "Não chora se não te mato", foi o recado do atirador. Um tio da jovem, Félix Paranhos, 34, disse que a sobrinha estava em estado de choque. "Os dois se amavam muito. É um absurdo que a gente perca tantas vidas com essa violência", disse o médico.
FOTO: DANIEL PROTZNER
Crime ocorreu Perdões, mas motorista só parou o ônibus na capital
Assaltos são constantes
Para motoristas de ônibus intermunicipais, a insegurança é grande nas estradas mineiras.
"O número de assaltos é muito alto, principalmente durante a madrugada", afirmou o coordenador do Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários de BH e Região (STTRBH), Jorge Alves.
"É preciso repensar o policiamento, se não, outros casos graves podem ocorrer", completou.
INVESTIGAÇÃO
Polícia aguarda as imagens
A polícia vai usar as imagens do restaurante em que os passageiros pararam, próximo a Perdões, para tentar identificar o atirador. A prima João Gabriel Camargos, a delegada Iara Camargos, irá viajar até a cidade para acompanhar as investigações. O estabelecimento confirmou que possui as gravações e que irá disponibiliza-las à polícia.
Segundo o relato dos passageiros, o homem aparentava ter 30 anos, era moreno claro, alto e usava boné. "Não temos muitas pistas, mas, com as imagens, ele será identificado e preso", afirmou. Até a noite de ontem, ninguém havia sido preso.
A investigação ficará com a delegacia de Perdões, região Centro-Oeste de Minas. Ontem, além de enfrentar a dor, a família de João Gabriel teve que conviver com a falta de estrutura da Polícia Civil. Eles tiveram que esperar por quatro horas para que a polícia retirasse o corpo do jovem de dentro do ônibus, na porta do hospital para onde ele foi levado, ao chegar em Belo Horizonte.
De acordo com um investigador da Polícia Civil que esteve no local, a demora é comum, já que a corporação tem apenas um rabecão em funcionamento. "Já esperamos até nove horas. Um absurdo para um Estado do tamanho de Minas. Temos funcionários, mas faltam carros", revelou.