Charge do Bessinha. reprodução do Arquivo Google
Jorge Béja
De agora em diante o povo brasileiro não vai ter mais confiança no Supremo Tribunal Federal. A própria corte tratou de instalar no país a insegurança jurídica. É até possível que o mau exemplo faça aumentar a violência urbana. O julgamento desta quarta-feira não foi jurídico, mas político. Foi um jeitinho, um arranjo, uma composição entre as chefias dos três poderes. O ministro Zavascki disse que é direito de todos comentar, aprovar, desaprovar, criticar as decisões do Judiciário. É o que faço. É o que todos fazem, com grande pesar. O Brasil estava de luto por causa da tragédia que acabou com o time da Chapecoense. O Brasil continua de luto. Agora, luto para sempre. Luto pela falta de civismo. De honestidade. De vergonha.
Quando hasteada e de hoje para sempre, a Bandeira Brasileira precisa ficar a meio-mastro. E antes de qualquer evento, como nos jogos de futebol, há de se guardar um minuto de silêncio. O julgamento de ontem colocou fim à independência dos poderes. Foi outra tragédia, noticiada antes pela imprensa e colunistas. Tragédia que aconteceu mesmo.
BEM ENSAIADA – A peça, mesmo de péssimo gosto, foi muito bem ensaiada. O primeiro ator a entrar em cena foi Marco Aurélio Mello. Depois, pela ordem, seria a vez de Teori Zavascki o segundo ator a contracenar. E eis que o decano Celso Mello – não, pela ordem, mas fora da ordem e para a desordem, pois seria o penúltimo ator a entrar em cena – pede a palavra a antecipa seu voto. Aliás, voto não. O decano apregoa o que ficou acertado no dia e na madrugada anterior.
Depois dele, só os atores Edson Fachin e Rosa Weber fugiram do “script” e destoaram do figurino e do texto. Este 7 de Dezembro de 2016, véspera do “Dia da Justiça”, a Suprema Corte da Justiça brasileira, que tem o dever de guardar, cumprir e fazer cumprir a Constituição Federal, não a guardou e a descumpriu.
E não venham dizer que a Constituição pode ser desrespeitada em nome da harmonia entre os poderes. Não. Não pode. Primeiro, o valor e o dogma maiores são a independência, a absoluta desvinculação, a soberania e a supremacia. Depois é que vem a harmonia.
PODER DESARMADO – A independência é de tal ordem suprema que dos três poderes o Judiciário sempre é o mais forte de todos. Porque é o poder desarmado, a quem cumpre dar a palavra final sobre o acerto e desacerto, a constitucionalidade ou não dos atos dos demais poderes, mantendo-os, amoldando-os à Carta Federal ou reformando-os.
Neste 7 de Dezembro de 2016, o STF, sem poder e sem competência, promoveu uma alteração na Constituição. Modificou a Carta. Emendou-a, mesmo sem ser poder legiferante. A corte apanhou a ADPF do partido Rede Sustentabilidade como se fosse um Projeto de Emenda Constitucional (PEC) e, usurpando o poder do Congresso Nacional, alterou a Carta da República.
A ordem de substituição ou sucessão do presidente e do vice presidente da República, no caso de impedimento ou vacância dos respectivos cargos, começa com a convocação do presidente da Câmara dos Deputados, prossegue com a convocação do presidente do Senado Federal e termina com o chamamento do presidente do Supremo Tribunal Federal. E assim termina.
Prerrogativa dos cargos – Se vê, sem esforço, que as prerrogativas são do cargo. Quem o ocupa é que vai sentar na cadeira presidencial. Mas a prerrogativa é do cargo. Nesta quarta-feira, porém, o STF decidiu que não é mais assim. Agora, se o presidente do Senado for chamado a ocupar a presidência da República e o senador que estiver na presidência daquela Casa Legislativa for réu em ação penal do STF, afasta-se o cargo, mesmo nele mantendo o senador-réu, e “pula-se” para o próximo na linha sucessória, no caso o presidente do STF.
O que é isso ,brava gente brasileira? Desde quando o STF pode fazer esta alteração na Constituição? Esta ou qualquer outra.
NOVO PARÁGRAFO – A decisão desta quarta-feira nada mais é do que acrescentar um parágrafo, que passa a ser o primeiro e único, ao texto do artigo 80 da Constituição, que tem a seguinte redação:
“Em caso de impedimento do Presidente e do Vice-Presidente, ou vacância dos respectivos cargos, serão sucessivamente chamados ao exercício da Presidência o Presidente da Câmara dos Deputados, o do Senado Federal e o do Supremo Tribunal Federal”.
E a modificação ao artigo 80 da CF que o STF com a decisão de ontem introduziu é para ser lida como um parágrafo 1º do seguinte teor:
“Se um dos sucessores indicados no caput deste artigo estiver respondendo a ação penal no STF, será chamado o sucessor que lhe seguir, sem obrigatoriedade de afastamento do mandato presidencial que seus pares a ele tenham outorgado”.
DECISÃO ILUSÓRIA – Sabemos que o texto da Constituição Federal continuará vigente como está hoje redigido. Que o artigo 80 não tem parágrafo algum. Mas a teratológica decisão de ontem do STF passa a ser jurisprudência da Corte. E como tal, importa e tem força como se fosse o acréscimo de um parágrafo ao artigo 80 da Magna Carta que os ministros do STF juraram cumprir e, pelo menos na sessão de ontem, não cumpriram.
Será que ainda há tempo e modo deles se redimirem?.
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