01/08/2013 às 16:21
Malhar agora o governo Dilma é fácil. Todo mundo faz isso. Difícil era considerá-lo “ruim de doer” (expressão a que recorri algumas vezes) quando sua popularidade estava nos píncaros da glória, né? Leio alguns e algumas colunistas, que se especializaram na nobre arte de puxar o saco, e constato, quem diria?, até mesmo laivos de indignação com o poder de turno! Tenho certo espírito de porco, confesso… Quase, só quase, me vem a vontade de defender a governanta. Mas não dá. Afinal, esse é mesmo um… governo ruim de doer!!! Tão ruim quanto o jornalismo que dosa seus elogios e suas críticas segundo as vagas da opinião pública. Quero ver é chutar cachorro com as presas à mostra, não os de boca banguela. Mas isso é com os leitores, certo? Se há os que prestigiam os analistas que ora pensam uma coisa, ora o seu contrário, não há mesmo nada a fazer. Dilma só não está mais perdida porque, de fato, nunca havia se encontrado.
Gostamos de pensar, porque isso nos conforta intelectualmente, que existe uma “razão da história”. Mas não há. Dilma é só uma personagem acidental de um — este, sim, existe — projeto de poder. Num dado momento, ela se transformou na figura mais adequada para representá-lo, para encarná-lo, até porque não ameaçava o seu principal narrador: Lula! Mas é fato que ela própria nunca soube bem por que estava lá e por que, a exemplo de toda dádiva, também esta lhe caiu no colo. O temperamento irascível foi transformado pelo marketing em convicção. E ela foi engabelando a turma. O fato, no entanto, é que a aparência severa escondia um deserto de ideias.
Parafraseando a um só tempo os poetas Carlos Drummond e Ascenso Ferreira, pergunto: “Pra que tanta severidade, meu Deus?”. E respondo: “Pra nada!”. Dilma — muito provavelmente estimulada por Aloizio Mercadante, ministro da Educação alçado a primeiro-ministro in pectore — decidiu ter outra grande ideia depois que as ruas começaram a gritar: quer retirar os gastos de estados e municípios com mobilidade urbana do cálculo do endividamento de estados e municípios, em mais um exercício de contabilidade criativa, matéria em que Guido Mantega se tornou especialista. É um despropósito!
A parte sensata das pessoas que ocupam as praças está cobrando mais seriedade do governo e do estado brasileiros. E a presidente decide responder como? Estuprado a Lei de Responsabilidade Fiscal, que serviu para pôr alguma ordem nas contas públicas. A LRF só não é melhor porque, infelizmente, o maior de todos os gastadores — o próprio governo federal — não está submetido aos mesmos rigores que vigem para estados e municípios.
Ora, ora… A Lei de Responsabilidade Fiscal só foi criada para que prefeitos e governadores, sob o pretexto de fazer o bem, não estourassem os cofres, largando dívidas impagáveis para seus sucessores — na certeza de que, afinal de contas, entes da federação não quebram, não entram em falência; não no Brasil ao menos. Nos Estados Unidos, por exemplo, a coisa é diferente. Evidentemente não se fecham prefeituras e governos, mas eles ficam impedidos de gastar, e isso vale também para o governo federal.
A LRF levou alguma ordem às contas públicas. Prefeitos e governadores podem ser legalmente responsabilizados por gestão temerária e perdem algumas vantagens na renegociação de dívidas com o governo federal. Se Dilma retirar da conta os “gastos com mobilidade”, vai acontecer o óbvio: abre-se uma vereda para que desembolsos efetuados em outras áreas entrem nessa rubrica. E lá vai para o vinagre a Lei de Responsabilidade Fiscal. Não custa lembrar que o petismo primitivo recorreu ao Supremo contra a LRF. Quando Lula chegou ao poder, a ação do partido tramitava no tribunal, embora Antonio Palocci, então ministro da Fazenda, a considerasse essencial para governar o Brasil… Isso é o PT!
Então não havia o que o governo pudesse fazer para incentivar a tal mobilidade? Ora, dá para fazê-lo por intermédio da abertura de linhas de crédito ou da desoneração fiscal, mas isso não surtiria o efeito desejado. O que o governo está tentando fazer é menos resolver o problema do que dar uma folga para governadores e prefeitos gastarem mais.
Sim, o governo Dilma é ruim de doer! Bem ou mal, a gestão petista tinha um tripé de credibilidade: política de meta da inflação, câmbio flutuante e controle fiscal. A propaganda sempre foi mais efetiva do que os fatos, é bem verdade. Mas ainda era melhor do que o descrédito. Em dois anos e meio, a gestão Dilma fez intervenções desastradas nos dois primeiros itens e, agora, anuncia que vai jogar uma pá de cal no terceiro. Antes, o pretexto era o crescimento. Não cresceu. Agora, diz que está está a responder à reivindicação das ruas… Ai, ai…
As praças pedem mais saúde e mais educação, e Dilma dá autorização para que se arrombem os cofres públicos e se enterre a LRF. Então a gente volta à origem das coisas, não é? Em 1994, entre uma função pública e outra, Dilma abriu uma lojinha de bugigangas importadas do… Panamá!!! O negócio durou um ano e meio. Teve de ser fechado, sob ameaça de falência.
O empreendimento tinha um nome, que fornece uma piada pronta, embora seja verdade: “Pão & Circo”.
Por Reinaldo Azevedo