Charge de Kleber Sales, reproduzida do Estadão
Carlos Newton
A principal arma da chamada “Operação Abafa”, que visa a inviabilizar a Lava Jato, é o vazamento alegadamente ilegal dos depoimentos em delações premiadas, que o próprio presidente da República tenta publicamente anular, com entusiástica cumplicidade da ministra Grace Mendonça, da Advocacia-Geral da União. O fato concreto é que o Planalto e as lideranças políticas procuram difundir a tese de que a Lei 12.850, de 2013, estabelece que vazamento é motivo para anular a delação. Mas esse argumento não passa de uma manipulação grotesca, porque tal determinação simplesmente não existe em lei.
É inacreditável, lamentável e abominável que essa falsa interpretação legal esteja sendo feita por um professor de Direito Constitucional como Michel Temer, que tem obras publicadas, e também por uma advogada pública concursada, pois ambos têm a obrigação de conhecer as leis, o compromisso de obedecê-las e o dever de jamais manipulá-las.
LIÇÃO DE BÉJA – O renomado jurista Jorge Béja já publicou aqui na Tribuna da Internet um estudo aprofundado sobre a Lei 12.850, mostrando que a determinação de que depoimento seja mantido em sigilo (até a delação ser homologada) tem apenas o objetivo claro de proteger o delator. Mas o que Temer e Grace exigem é justamente o contrário – proteger os corruptos citados pelo depoente e anular a delação premiada. Ou seja, querem virar a lei de cabeça para baixo, com o único objetivo de defender interesses inconfessáveis.
Conforme o dr. Béja demonstrou aqui na TI, em nenhum dispositivo a Lei 12.850 prevê a nulidade dos atos praticados na investigação ou no inquérito. Vamos ao artigo 5º:
“São direitos do colaborador ter o nome e informações preservados e não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser fotografado ou filmado, sem prévia autorização por escrito“.
Ou seja, a intenção é preservar o delator. É só isso que diz a lei. Onde está escrito que o vazamento acarreta o prejuízo da nulidade da delação premiada?
SEM SIGILO – O artigo 7º da referida lei dispõe que o pedido de homologação do acordo será sigilosamente distribuído e o acordo de colaboração premiada deixa de ser sigiloso assim que recebida a denúncia.
É óbvio que o objetivo é proteger o delator e não os corruptos e corruptores, ou será preciso fazer um desenho para que os doutores Temer e Grace entendam o espírito da lei, que em nenhum dispositivo abriga previsão legal que impeça e resulte em nulidade caso venha ocorrer o vazamento.
Mas Temer insiste. Além de enviar na segunda-feira (dia 12) uma carta a Rodrigo Janot, procurador-geral da República, assinada também pela advogada-geral da União, cujo teor foi imediatamente divulgado pelo Planalto, para fazer estardalhaço, na quinta-feira (dia 15) o presidente da República insistiu na manobra, num encontro pessoal com o procurador Janot.
ARGUMENTOS FALACIOSOS – Segundo informação de um assessor palaciano, o presidente disse a Janot que é importante que o Ministério Público mantenha a linha da “legalidade”, evitando repassar informações das delações. Ou seja, sem ter a menor prova, Temer afirma os vazamentos da delação de Cláudio Melo Filho, ex-vice-presidente de Relações Institucionais da Odebrecht, partiram dos procuradores da Lava Jato.
A tese de Temer, segundo o mesmo assessor palaciano, é de que “ninguém consegue governar, quando vazamentos só jogam o governo para dentro do buraco”. Em tradução simultânea, isso significa que o governo do PMDB está atribuindo a crise econômica à Lava Jato, repetindo a justificativa fajuta que o governo do PT inventou e agora o governo do PMDB tenta perpetuar. Se Abraham Lincoln assistisse a essas cenas, perguntaria se Temer, Grace & Companhia pretendem enganar a todos, por todo o tempo.
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PS – Ainda não há provas de corrupção (propinas) contra Temer, apenas caixa 2 de campanha. O presidente sabe que não será derrubado antes de acabar seu mandato-tampão, dia 31 de dezembro de 2018. Deveria então se preocupar em governar, ao invés de ser usado pelos caciques do PMDB e dos demais partidos que se envolveram em corrupção. O assunto é importantíssimo, e logo voltaremos a ele com outras informações exclusivas. (C.N.)