Por A Catequista em 03/10/2016
“Um dos preceitos aos quais os católicos devem estar atentos é o de dar esmolas aos pobres. Mas atenção: a forma correta de dar esmolas não é dar dinheiro às pessoas que mendigam nas ruas, e sim ajudar uma instituição de caridade séria, ligada ou não à Igreja.”. Esse foi um trecho da homilia que ouvi dia desses. O padre está certo?
Depende. Essa conceituação é um tanto controversa e precisa ser melhor explicada, porém, considerando a realidade do meu bairro, o que padre disse faz muito sentido. Afinal, a grande maioria dos pedintes na região da minha paróquia é de aproveitadores, vadios por opção ou consumidores de drogas.
Minha rua costuma ter uma grande concentração de pedintes, quase todos viciados em drogas. Outro dia, vi um grupo de pessoas parar o carro diante deles, abrir o porta-malas e distribuir quentinhas. Meu sentimento diante desta cena foi dúbio: ao mesmo tempo em que admirei o nobre senso de solidariedade, ponderei a ingenuidade daqueles que promovem e sustentam a permanência dos “sem-teto” nesta triste situação.
Muitos drogados são recolhidos das ruas pela Prefeitura e levados para centros de desintoxicação e ressocialização, mas não aceitam ali permanecer. Outros rejeitam a ajuda de suas próprias famílias e se recusam a sair das ruas, onde não precisam obedecer regras e sempre arrumam quem lhes dê dinheiro e comida. Nas grandes cidades, não são raros os pedintes que chegam a ganhar bem mais do que um trabalhador assalariado.
E as maiores vítimas das esmolas irresponsáveis são as crianças. Por exemplo: muitas famílias recebem do governo federal uma ajuda mensal de R$ 200,00 para que seus filhos deixem de vender produtos nas ruas. Entretanto, muitos abrem mão deste benefício e preferem continuar a expor seus filhos aos perigos das ruas, pois é mais lucrativo. Então, quando compramos produtos de crianças nas ruas, em vez de ajudar, podemos estar reforçando ainda mais as correntes da miséria e da exploração.
Campanha da Sec. de Assistência Social de Ribeirão Preto
– A esmola torna mais difícil para as equipes convencerem as crianças dos aspectos negativos da rua. É uma concorrência desleal – diz a coordenadora da comissão do Comissão Municipal de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil, Júlia Obst. (Fonte: Zero Hora)
“Ah, mas eu nunca dou dinheiro. Dou roupas ou comida”. Dá quase no mesmo, amigo. Qualquer doação pode servir como um incentivo para que a pessoa se acomode na situação de pedinte.
Pense: que criança ou adolescente vai querer ficar em um abrigo, quando as ruas lhe oferecem tantas vantagens materiais imediatas? E, ao permanecer nas ruas, seu destino é quase certo: prostituição, vício e delinquência.
“Então, o que devo fazer quando uma pessoa me pede ajuda na rua?”. A única resposta honesta que tenho para dar é NÃO SEI! Não acredito que haja uma fórmula exata para resolver a questão, mas é importante discutirmos o problema. Vamos refletir um pouco antes de dar esmolas.
Entretanto, sejamos sensíveis e estejamos alertas para notar as situações em que o discurso de “não dê esmolas” é desumano e não se aplica. Há, sim, casos em que uma pessoa na rua realmente deve ser assistida com comida, roupas ou dinheiro.
“Dê a quem pede a você e não peça para devolver, pois o Pai quer que os seus bens sejam dados a todos. (…) Ai de quem recebe: se recebe por estar necessitado, será considerado inocente; mas se recebe sem ter necessidade, deverá prestar contas do motivo e da finalidade pelos quais recebeu. Será posto na prisão e interrogado sobre o que fez; e daí não sairá até que tenha devolvido o último centavo.
A esse respeito, também foi dito: Que a sua esmola fique suando nas mãos, até que você saiba para quem a está dando.”
Trecho da Didaqué, o primeiro Catecismo da Igreja
Ao ler esse trecho da Didaqué, fica evidente que a existência de pedintes malandros não é um fato novo. Ainda assim, os cristãos devem manter o espírito sempre disposto à partilha (“Dá a quem pede); ao mesmo tempo, devem cultivar a devida prudência (“Que a sua esmola fique suando nas mãos, até que você saiba para quem a está dando”).
Cada caso é distinto. O contexto em que os pedintes se inserem muda muito conforme a época, a cidade, a cultura e a economia. Vamos pensar em uma noite de inverno, em uma cidade serrana no Sul do Brasil. Como um cristão poderia negar roupas, comida quente ou cobertor a uma pessoa que bate os dentes na rua, ainda que seja viciada em drogas ou vadia por opção?
Este pobre sem-teto precisa de uma MULHER RICA. Alguém aí pode ajudar?
Ao ver uma mulher pedinte com um bebê nos braços (eu sei, em muitos casos, isso envolve malandragem e exploração), muita gente questiona: “Por que não vai trabalhar?”. Ok… E com quem ela vai deixar o bebê? Nem todos têm parentes dispostos a cuidar de seus filhos, e o número de vagas em creches gratuitas em nosso país é pra lá de insuficiente.
Já vi crianças fazendo pequenos serviços nas ruas para complementar a renda familiar – engraxar sapatos, carregar sacolas de compras etc. –, mas que estudavam e eram bem criadas. Apesar desta situação passar longe do ideal, seus pais não tinham intenção alguma de lhes explorar.
A decisão não é óbvia, nem fácil. Pesando todos os fatores relacionados à esmola, procuremos usar o bom senso e orar. Lembremos sempre que um pobre que sofre é Jesus que sofre. Que o Senhor nos dê o amor, a generosidade e o discernimento necessários.
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Este post foi originalmente publicado em 18/02/2013.
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