quinta-feira, 1 de novembro de 2012

A arrogância de Cardozo na campanha eleitoral antecipada. Ou: Por que o ministro não leva para presídios federais 1.600 presos que não deveriam estar em SP? Respondo: porque ele não tem onde colocá-los

01/11/2012 às 6:53

A arrogância, que avançou para a falta de educação, de José Eduardo Cardozo, ministro da Justiça, não tem limites. Está comprovado por A mais B: o governo federal criou uma farsa — a suposta oferta de ajuda ao governo de São Paulo, que a teria recusado, na área de segurança. Como Cardozo ganhou reportagens escancaradamente favoráveis no “Jornal Hoje” e no “Jornal Nacional” (não vi as do SPTV), então insiste na falseta. Quem apanhou foi o secretário de Segurança, Antonio Ferreira Pinto, que fala a verdade. Aquele que não consegue provar o que diz saiu-se como sensato. Aquele que tem os fatos a seu favor foi tratado como falastrão. Parece que está em curso a construção de uma nova moral, que poderia ser assim sintetizada: os fatos que se danem!

Antes que entre em alguns detalhes e recupere alguns eventos importantes, vai aqui uma informação adicional — pela qual, tudo indica, a imprensa isenta não se interessou, já que é do seu conhecimento. São Paulo tem presos 1.800 estrangeiros. Pelo menos 1.600 deles cometeram crimes federais e deveriam estar em… presídios federais. Só que Cardozo não tem onde abrigá-los. Então os deixa em São Paulo. Não obstante, oferece aquilo de que o estado não precisa: algumas vaguinhas em presídios de segurança máxima.

Já escrevi dois textos a respeito. O primeiro está aqui. Ali demonstro que Cardozo jamais ofereceu ajuda a São Paulo. Não há um só documento a respeito. Ele alega que foi tudo em conversas informais. Cardozo é assim: encontra com um secretário de estado e pergunta: “Quer uma ajudazinha, uma colaboração?” Inexiste essa instância de interlocução, senhores leitores, como todo mundo sabe. Trata-se de uma farsa. No post, demonstro também que o que se deu foi o contrário: o estado de São Paulo é que encaminhou um pedido de colaboração ao governo federal. Foi no dia 29 de junho (quem não leu o texto encontra lá o documento na íntegra). Cardozo fez a sua resposta chegar ao Palácio dos Bandeirantes sabem quando? ONTEM! Mais de quatro meses depois.

A resposta de Cardozo e o surrealismo
Não pensem, no entanto, que foi uma resposta convencional. Não foi, não! O ministro enviou o texto, primeiro, para a Rede Globo. Atenção! Um ofício endereçado ao governador de São Paulo — ele se chama Geraldo Alckmin, mas poderia se chamar, como no poema de Drummond, J. Pinto Fernandes — chegou primeiro ao “Jornal Hoje”. Só foi enviado ao Palácio dos Bandeirantes no começo da noite.

Eis Cardozo. Quem primeiro ficou sabendo que a presidente Dilma teria oferecido ajuda a São Paulo (ajuda que teria sido recusada!!!) foi o “Painel”, da Folha, na véspera da eleição, dia 27. No dia seguinte, Ferreira fez o óbvio: negou, e era mentira mesmo. Ou Cardozo tinha algum ofício, alguma proposta formalizada? Nada! Não contente, ele concedeu uma entrevista ao jornal na segunda-feira, dia 29, reafirmando a invencionice. Pego na inverdade — o governo de São Paulo, sim, é que lhe havia feito um pedido, sem resposta —, continuou a se preocupar primeiro com a “mídia”, como se diz. O “Jornal Hoje” levou o documento ao ar, não disse que data tinha e dispensou a Ferreira o tratamento que se dispensa a um mentiroso.

A VEJA.com fez uma reportagem a respeito e traz a resposta do ministro. O documento é datado, pasmem!, de 30 de outubro. DATA ESCRITA A MÃO! Como ele já havia falado em off e dado as suas entrevistas malcriadas, seu texto repete, em síntese, as más-criações. E sem propor coisa nenhuma. A imagem do documento enviado por ele está aqui. Não chega a dizer que o governo federal não é a Casa da Moeda, mas deixa claro que não dará um tostão. Parece que ele gostaria, assim, só de discutir a relação, entendem? De bater uma DR…

O cheiro de sangue que excita
Notem: quando Ferreira Pinto enviou o pedido de colaboração ao governo federal, a questão da segurança pública não tinha essa urgência. O recrudescimento se deu na reta final da eleição — um hábito do PCC, que já deixou claro que, na sua opinião, a população não deve votar em tucanos. Marcola tem suas preferências partidárias. Parte do jornalismo também. Acidentalmente, coincidem.

Muito bem! Cardozo se calou porque, bom petista que é, pode ter pensado: “Por que eu vou puxar brasa para a sardinha do inimigo?” Lembrem-se de que ele estava sobre o palanque até no dia da eleição. Aquele que Dilma classificou, com graça, de um de seus “Três Porquinhos” deu aquela declaração ao Painel em meio à campanha eleitoral, da qual participou ativamente.

Junho, julho, agosto, setembro… Silêncio do companheiro. Chegou a eleição, ele não resistiu! Resolveu faturar política e partidariamente com o recrudescimento da violência em São Paulo — ainda que o Estado esteja entre os menos violentos do Brasil. O cheiro de sangue parece ter despertado o lado lobo do “porquinho”.

Delinquência política e “aparelhos de ginástica”
Cardozo está buliçoso, dando entrevistas, falando pelos cotovelos. É bom que fale. Assim sabemos direito o que ele pensa. A VEJA.com publica uma entrevistacom ele, que repetiu ao site uma fala a que o Jornal Nacional deu destaque em certo tom de denúncia: São Paulo estaria pedindo dinheiro até para aparelhos de ginástica! É espantoso! Fui o primeiro a publicar o ofício enviado pelo governo de São Paulo ao governo federal com a lista de programas nos quais poderiam ser empregados recursos federais. De um total de R$ 148.888.839,28 que caberiam à União, apenas R$ 345.164,60 diziam respeito ao “Núcleo de Condicionamento Físico da Academia de Polícia” — ou seja, APENAS 0,23%. Esse 0,23% de um amplo programa acabou merecendo tratamento hostil, como se a Polícia de São Paulo estivesse em busca de algum privilégio inaceitável. NOTO: fala-se de capacitação de um núcleo fundamental para a atividade policial, sim! A Secretaria não propôs a criação de um núcleo de lazer.

Documento que não diz nada
Muito bem! No documento redigido às pressas para ser entregue primeiro à TV Globo — e só muitas horas depois ao governo de São Paulo (FOI ENVIADO POR FAX!!!) —, o que Cardozo oferece mesmo? Além de vagas para prisioneiros perigosos, coisa de que São Paulo não precisa, ele não diz mais nada! Tanto as suas supostas conversas anteriores com representantes do governo são mera cascata que o ministro não consegue, mesmo agora, dizer que tipo de ajuda pode oferecer a São Paulo. Limita-se a falar em “ações de inteligência”… Quais?

Se alguém encontrar lá uma proposta concreta (além do oferecimento de meia dúzia de vagas), ganha do Tio Rei uma garrafa de Glenmorangie 18, que a vida não há de ser só essa água…

No texto em questão, ele poderia ter desmoralizado Ferreira Pinto: “No dia X, o governo ofereceu tal coisa, conforme o ofício tal, mas houve recusa. Já no dia Y, o Ministério da Justiça propôs…” Ocorre que Cardozo não tinha nada! Bom petista, já escrevi aqui, ele, pelo visto, não gosta de assinar atos de ofício…

Concluo
É muito grave o que está em curso. Setores da imprensa decidiram que é hora de derrubar o secretário de Segurança de São Paulo. Houve, sim, recrudescimento da violência, mas a situação está longe de caracterizar perda do controle ou algo assim. Há muito o crime organizado tenta interferir na política de segurança do estado — aquela mesma que reduziu o índice de homicídios em mais de 70% em 12 anos. Da quase ponta da lista de mortos por 100 mil, São Paulo foi parar na rabeira.

Estes são os dados do Mapa da Violência sobre mortos por 100 mil nas unidades da federação em 10 anos. Vejam os números.


Não obstante, criou-se uma onda terrorista em São Paulo. Em vez de as forças legais de segurança merecerem o amparo do governo federal e da própria imprensa, o que se vê é um esforço deliberado para desestabilizá-las. E que se note: onde houver erro, que se aponte. O que não é possível é dar curso a uma vigarice que tem apenas viés político-partidário.

Se setores da imprensa, o PCC e o governo federal querem a mesma coisa — a queda de Ferreira Pinto —, obrigo-me a achar que ele não pode estar assim tão errado…
Texto publicado originalmente às 4h49
Por Reinaldo Azevedo

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