Negociação. Reportagem fez contato e discutiu preço e entrega da arma de pressão pelo WhatsApp; todo o processo durou apenas um dia.
PUBLICADO EM 09/10/17 - 03h00
MARIANA NOGUEIRA
Dois rapazes foram presos na quarta-feira após um sequestro-relâmpago. O crime poderia ter sido evitado caso eles tivessem sido detidos dias antes, quando foram abordados em uma blitz e disseram aos policiais que estavam a caminho de cometer um roubo. Mas eles foram liberados porque nenhum crime tinha sido cometido ainda e a arma que carregavam era uma réplica, o que não é uma infração. Valendo-se dessa lei e da facilidade de comprar armas de pressão e simulacros sem fiscalização, crimes são cometidos diariamente, aumentando o clima de insegurança entre a população.
Segundo o Estado, 1.718 armas falsas foram apreendidas em Minas. Entre os anos de 2015 e 2016, houve um aumento de 23,7% nas apreensões. Cresceu também o número de crimes cometidos com os simulacros.
A reportagem de O TEMPO comprou uma dessas armas no mercado informal, seguindo anúncio encontrado em um vagão do metrô. A aquisição foi por um preço mais baixo que o praticado pelas lojas autorizadas e sem apresentar identificação nem comprovar a finalidade para a prática de paintball ou coleção, como pede a lei.
Para o transporte de armas do tipo, é necessário andar com a arma protegida em um compartimento fechado. A ponta colorida deve ser mantida, e o proprietário precisa andar com a nota fiscal.
Passo a passo. O anúncio no metrô estava em uma folha de papel A4 comum. O vendedor frisava a facilidade da aquisição e dizia que os produtos eram 100% legalizados e muito parecidos com armamentos de verdade. A arma adquirida é uma airsoft de pressão com calibre de 6 mm, que já vem com coldre e imita uma pistola Colt M1911. O contato e toda a negociação para a compra foram feitos pelo WhatsApp. A entrega aconteceu perto Mineirão – o local foi escolhido pelo vendedor, que não se identificou.
O único questionamento do vendedor foi: “caso seja um policial civil, pode desistir porque eu acabo com você na corregedoria”. O homem apresentou uma nota, mas o produto descrito e o valor pago não condiziam com a mercadoria adquirida. A reportagem pagou R$ 450 pela arma.
“A gente percebe que essas armas têm sido utilizadas em muitos roubos, principalmente os simulacros. Percebe-se que eles têm optado por essas armas”, disse o chefe da Sala de Imprensa da PM, major Flávio Santiago.
Exército só fiscaliza comércio regular
Ainda que o vendedor da arma de pressão comprada pela equipe de O TEMPO não tenha autorização para comercializá-la, ele não passaria nunca pela fiscalização do Exército. O órgão, de acordo com o Estatuto do Desarmamento, é o responsável por esse tipo de comércio, mas só fiscaliza estabelecimentos regularizados.
“O Exército só pode fiscalizar lojas credenciadas a ele. E não é permitido vender paralelo à loja. Não existe isso de vender fora de loja. Não pode. Então, essa pessoa que comercializou essa arma para vocês, pela forma como fez, muito provavelmente não tem registro no Exército, e ela deve estar vendendo produto de contrabando”, explicou o coronel Marcus Messeder, da 4ª Região Militar do Exército em Minas.
Ainda de acordo com o coronel, quando eles identificam casos como contrabando, abrem um processo administrativo. “Aí apuramos os crimes que podem ter sido cometidos”.