Charge do Dum (dumilustrador.blogspot.com)
Angélica Diniz
O Tempo
De farinha “seca-barriga” a chocolates “língua de gato”. Esses são apenas alguns dos itens consumidos por deputados federais eleitos por Minas e que são pagos com o dinheiro do contribuinte. As despesas também incluem refeições sofisticadas, centenas delas nos fins de semana e nos feriados, em restaurantes não só nas cidades que são bases eleitorais dos parlamentares, mas também no litoral e na Serra Gaúcha. Há ainda contas que indicam o pagamento de passagens e refeições para terceiros, inclusive no mesmo dia e horário, em Estados diferentes.
Com salário de R$ 33,7 mil, suficiente para cobrir despesas pessoais, vários deputados optam pelo uso da Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar (Ceap). De janeiro a julho deste ano, os deputados federais mineiros pediram R$ 11,7 milhões de ressarcimento da cota. Esse benefício extramensal de R$ 36 mil, criado para apoiar ações dos parlamentares, tem sido usado para financiar despesas questionáveis, se não do ponto de vista legal, pelo menos do ponto de vista ético.
Um exemplo vem do deputado Aelton Freitas (PR), que usou a verba para pagar sua primeira refeição do ano, em Camboriú (SC), uma das mais concorridas praias do Sul do país. No almoço pós-réveillon, ele gastou R$ 145,40 em salmão, petit gâteau e outros itens. A assessoria do parlamentar afirmou que o pedido de reembolso está regulamentado pelo Ato da Mesa nº 43/2009. “Aelton Freitas é parlamentar em tempo integral, e isso lhe confere o ressarcimento com alimentação”, explicou a assessora, ao ser questionada se o deputado estava a serviço.
EXERCÍCIO DO MANDATO – Segundo a Câmara Federal, o Ato 43/2009 prevê entre gastos passíveis de reembolso passagens, fretamento de aeronaves, táxi, estacionamento, hospedagem, consultorias, divulgação de atividade e alimentação. “Desde que sejam vinculados ao exercício do mandato”, diz nota enviada a O Tempo.
A norma, no entanto, tem brechas para permitir certas despesas. Os gastos, segundo a Câmara, podem ser efetuados, independentemente do dia da semana, em qualquer parte do país. “Os itens que podem ser incluídos nas despesas com alimentação não são especificados, mas o normativo estabelece que não será objeto de ressarcimento o gasto com certos gêneros alimentícios, couvert artístico, bebidas alcoólicas e embalagens (quentinhas)”, informa o texto.
Dentro dessa lógica, o consumo de parte dos deputados, que acumula notas de bares e restaurantes nos fins de semana, está dentro dos preceitos da Casa. Levantamento feito pela reportagem, porém, encontrou gastos inusitados, como a compra de chocolates “língua de gato” e “nhá benta” por R$ 60,50, pelo deputado Carlos Melles (DEM). Após ser questionado, o gabinete admitiu o erro e estornou o valor.
“SECA BARRIGA” – Eduardo Barbosa, do PSDB, incluiu na mesma nota de sua refeição uma porção de farinha “seca-barriga”, produto voltado para perda de peso. O parlamentar alegou fazer uso de produtos similares por recomendação médica, já que possui problemas de saúde. Quem parece ter iniciado uma dieta é Dimas Fabiano (PP), que gastou uma média de R$ 1.000 por mês em refeições congeladas light. Sem ver problemas, a assessoria disse que o pepista opta por almoçar no próprio gabinete.
A Câmara dos Deputados informou que cabe ao deputado responsabilizar-se pela compatibilidade do gasto com a legislação, fato que atesta expressamente mediante declaração escrita.
O uso da verba indenizatória para compra de passagens e hospedagem é restrita apenas a deputados federais e seus assessores. No entanto, em pelo menos duas ocasiões neste ano a namorada do tucano Caio Narcio, Ana Lucília Reis, apareceu em notas de bilhetes aéreos e diárias de hotel como acompanhante do parlamentar. A assessoria de Caio Narcio atribuiu os casos a um erro da própria equipe do gabinete e prometeu devolver os valores.
NA SERRA GAÚCHA – Já Stefano Aguiar (PSD)passou um fim de semana de maio nas cidades de Gramado e Canela, na Serra Gaúcha, onde gastou em restaurantes valores de refeições para duas pessoas. A reportagem não conseguiu falar com o deputado.
Além de frequentar os mais conceituados restaurantes de Belo Horizonte, Fábio Ramalho (PMDB) pediu reembolso de R$ 1.605 da passagem entre Porto Seguro (BA) e Recife (PE), no dia 8 de janeiro. Até o fechamento desta edição, Ramalho não se posicionou sobre o motivo da viagem no recesso parlamentar.
Ademir Camilo (PTN) costuma gastar com várias refeições aos sábados e domingos e apresentou no mesmo dia, 2 de abril, em horários próximos, duas notas referentes a refeições, só que uma delas em São Luiz (MA) e outra na capital mineira. Ele não retornou o contato.
O deputado Renzo Braz (PP) apresentou notas de alimentação em Guarapari e Marataízes, litoral do Espírito Santo. Do mesmo partido, Pastor Franklin Lima fez refeições em Bertioga, cidade praiana no interior de São Paulo, e nos municípios baianos de Catolândia e Barreiras, onde também se hospedou em janeiro deste ano. Em ambos os casos, apesar das diversas tentativas de contato com os deputados federais, a reportagem não conseguiu retorno dos pepistas mineiros.
ATÉ MANOBRISTA – Na lista de itens incluídos pelos deputados nos pedidos de reembolso estão serviço de manobrista, couvert artístico, consumo no bar da piscina de um hotel e até bebida alcoólica. Essa última foi consumida pelo assessor do deputado Subtenente Luiz Gonzaga Ribeiro (PDT) durante estadia no Rio de Janeiro.
Margarida Salomão (PT), junto a três assessores, apresentou nota de consumo no valor de R$ 230 no “bar da piscina”, segundo o comprovante do hotel em que se hospedou também na capital fluminense. O motivo da viagem, de acordo com a assessoria da deputada, foi a participação da equipe em atividade de capacitação e formação política.
Em uma das muitas despesas do Delegado Edson Moreira (PR) pelas pizzarias da capital, houve gasto até com serviço de manobrista. Também adepto das pizzas, o correligionário Bilac Pinto disse que se encontrava em trânsito para BH, após realizar viagens em municípios de sua base. Adepto da comida japonesa, Leonardo Quintão (PMDB) também disse que atende sua base nos fins de semana. Por fim, deputados como Saraiva Felipe (PMDB) e Dâmina Pereira (PSL) gastam valores altos com refeições, sendo que as notas não trazem o detalhamento dos itens consumidos.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – A péssima conduta dos deputados mineiros é praxe na Câmara, mostrando o baixo nível da classe política, como um todo. É desanimador. (C.N.)
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