14/09/2015 às 20:24
Por Reinaldo Azevedo
É incrível que o governo tenha feito só agora o que deveria ter feito antes, não é? Essa história de que a Standard & Poor’s acabou colaborando com um ajuste que, de outra sorte, não seria feito é só uma variação do “quanto pior, melhor”. Um governo que tivesse articulação política teria proposto antes essas mesmas medidas — ainda que não seja tão fácil implementá-las.
O pacote tem lá as suas durezas, mas notem que muito pouco do que se pretende economizar sai do corte efetivo do custeio da máquina: apenas R$ 200 milhões. Para um estado pantagruélico, é muito pouco.
De toda sorte, a crise tende a dar uma esfriada. E por quê? Apenas porque o governo decidiu comparecer com uma proposta, saindo daquele estado de apatetamento inercial. “Algo está sendo feito; algo está sendo tentado…” Assim, alguns agentes políticos vão tirar um pouco o pé do acelerador do “fora Dilma”. Se voltarão a pisar com mais firmeza de novo, bem, aí depende de como vão reagir os agentes econômicos e a população.
A sociedade é que vai pagar a conta, sim. A economia será feita também com cortes em programas sociais, e parte da receita que se busca saíra da recriação da CPMF — se é que o Congresso condescenderá com o imposto, que Joaquim Levy chama de “transitório”, para a crença de ninguém.
Se querem saber o quanto isso foi devidamente pensado, basta verificar que, quando lançou o balão de ensaio da recriação do imposto, o petista Arthur Chioro (ministro da Saúde) saiu a bradar que era dinheiro para a Saúde. O governo, por sua vez, dizia que era para fazer caixa mesmo, e, agora, anuncia-se, será para a Previdência.
É claro que o pacote não vai colaborar para aumentar o prestígio da presidente Dilma. Elevação de impostos é sempre desgastante, não?, especialmente porque ela vem num momento em que a população tem a sensação, que não está tão distante da realidade, de que ela se esforça para que alguns poucos espertalhões se locupletem. Mas qual alternativa?
Um pouco de honestidade intelectual e transparência talvez fosse útil ao governo. Mas Dilma não é do tipo que reconhece facilmente o erro. No nono mês de seu segundo mandato, é obrigada a admitir, na prática, que caminhou muito errado nos últimos quatro anos.
O conjunto das medidas pode até esfriar um pouco o clima anti-Dilma no Congresso e no mercado, mas certamente aumentará a animosidade das ruas com o governo.
Dilma tentará a todo custo dividir com o Congresso o peso das medidas impopulares. Até onde os senhores parlamentares estão dispostos a condescender? A petista poderia, ao menos, ter a humildde de ir a público explicar que está sendo obrigada a se desmentir e que não vai cumprir o que anunciou na campanha. Mas não creio que o fará.
Vamos ver qual será a reação, na prática, do PT e das esquerdas. O pacote não contempla algumas sugestões dos companheiros, que queriam brincar de comer o fígado dos ricos para satisfazer a suposta necessidade de sangue dos mais pobres — que não existe e é uma invenção de intelectuais de meia pataca.
Com o pacote, a presidente chancela o estelionato eleitoral e espera contar com a boa vontade dos enganados para chegar até o fim do mandato.
Por Reinaldo Azevedo