Por Juliana Siqueira e Aline Diniz Publicado em 18 de agosto de 2022 | 10h00 - Atualizado em 18 de agosto de 2022 | 10h08
Casa com idoso pegou fogo em Jureia no início de julho; bombeiros estavam a cerca de uma hora do local — Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais/Divulgação
Setenta quilômetros separam Santo Antônio do Monte, na região Centro-Oeste do Estado, do batalhão do Corpo de Bombeiros mais próximo, localizado em Nova Serrana, na mesma região. A chamada pode demorar até duas horas para ser atendida no município. São, ao todo, 50 fábricas de fogos de artifício e zero bombeiros. Santo Antônio do Monte é uma das 767 (90%) cidades mineiras que não têm uma unidade da corporação. No entanto, o lugar tem um diferencial: cerca de 1.500 habitantes trabalham em indústrias de fogos de artifícios. Nessa quarta-feira (17), dois deles morreram após uma explosão de uma fábrica.
"Eles (bombeiros) demoram cerca de duas horas. Quando eles chegam, não tem mais o que socorrer. A presença dos bombeiros aqui é urgente", afirma Roberto Gonçalves da Silva, presidente do Sindicato dos Trabalhadores das Fábricas de Fogos de Artifícios.
Na cidade, nesta época de mudança da temperatura, os incidentes costumam aumentar, já que os itens usados na confecção dos produtos reagem a essas transformações no tempo, o que pode causar combustão.
"Seria melhor todo mundo ficar em casa. Nesta época do ano, tem barracão (local de trabalho), que pega fogo sozinho", comenta o sindicalista. Enquanto sobrevivem a um verdadeiro barril de pólvora, os funcionários têm medo de denunciar os patrões, já que a atividade é a "força de trabalho da região".
De acordo com informações do Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais, a instalação das unidades da corporação segue parâmetros técnicos, como a população municipal. As cidades com mais de 30 mil habitantes são elegíveis para essa instalação - Santo Antônio do Monte tem aproximadamente 30 mil, conforme informações da prefeitura da cidade.
“A classificação quanto à ordem de prioridade é definida a partir do Índice de Vulnerabilidade de Risco (IVR), que é calculado por meio da ponderação de características dos espaços urbanos que influenciam no risco de desastres”, afirma o Corpo de Bombeiros, em nota.
Mesmo sem os mais de 30 mil habitantes, a presença de uma unidade do Corpo de Bombeiros em Santo Antônio do Monte seria muito importante, conforme o prefeito Léo Camilo (Avante). Ele destaca como razões para essa relevância o porte da cidade, além de o município ser considerado a capital latino-americana dos fogos de artifício.
Mais recentemente, na noite da última segunda-feira (15), a cidade de Ferros, na microrregião de Itabira, na região Central de Minas Gerais, ficou sem luz após um homem colocar fogo em um ônibus, que atingiu a rede elétrica. Como o Corpo de Bombeiros está localizado há cerca de uma hora do local, quem ajudou a conter o fogo foram moradores e trabalhadores da Prefeitura.
“O avanço do incêndio, com o passar dos anos, está cada vez mais rápido, até pelos tipos de materiais que temos colocado em casa e nas indústrias, como mais plásticos. É uma corrida contra o tempo. Quando não há uma unidade do Corpo de Bombeiros, provavelmente não vai dar para contar com a equipe para combater o início do fogo. Muitas vezes, farão um trabalho posterior, para as chamas não se dissiparem ainda mais, como para outras residências”, diz o engenheiro de segurança contra incêndio Fabrício Nogueira.
O que diz o Corpo de Bombeiros
A capitão Thaise do Corpo de Bombeiros reconhece que o tempo é, sim, importante quando se trata de incêndios. Por isso, afirma ela, atualmente a corporação busca uma redução desse prazo de atendimento. Muitas vezes, conforme diz ela, as condições de algumas estradas podem ser desafiadoras, mas há artifícios para driblar esses impasses.
“Nós buscamos uma redução desse tempo, inclusive com a utilização de helicópteros”, salienta. “Estamos sempre buscando atender da melhor forma possível. Cada unidade do Corpo de Bombeiros conhece todos os municípios que serão atendidos por ela. Existe uma questão de gerenciamento e controle. As unidades fazem essa cobertura de forma estratégica. Há responsáveis por cada local”, diz.
Prevenção
Se, muitas vezes, há diversos desafios para o atendimento de ocorrências, a prevenção se torna ainda mais relevante. Professor do Instituto de Geociências da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Marcelo Nero destaca que é importante ações de conscientização para evitar focos de incêndio.
“Vegetação muito seca pode pegar fogo com alguma ação humana, como o descarte de cigarro. Com casas próximas, as chamas podem se expandir. Em terrenos baldios, as pessoas costumam queimar diversos materiais, que podem causar um incêndio perigoso. Ações de conscientização podem evitar essas ocorrências”, salienta ele.
Relembre os casos
Em pouco mais de um mês, foram registradas pelo menos cinco ocorrências de incêndios de repercussão em locais onde não há unidades do Corpo de Bombeiros. Em alguns, a própria população precisou agir.
Dia 1º de julho - Um idoso de 84 anos foi salvo por vizinhos após a casa onde morava pegar fogo enquanto ele dormia. O caso foi registrado no distrito de Jureia, em Monte Belo, no Sul de Minas.
De acordo com informações do Corpo de Bombeiros, pelo menos 4 mil litros de água foram utilizados no combate às chamas. A Defesa Civil iniciou o serviço até a chegada dos militares, que partiram de Guaxupé, a cerca de uma hora do local.
Dia 5 de agosto - Um menino de cinco anos morreu após a casa em que morava ser incendiada no distrito de Santa Maria do Baixio, em São João do Oriente, na região do Rio Doce. De acordo com os Bombeiros, o corpo do menino foi encontrado debaixo de um colchão consumido pelo fogo.
Vizinhos tentaram controlar o fogo jogando água com mangueiras de jardim até a chegada das equipes dos bombeiros. O incêndio foi combatido por equipes de bombeiros de Ipatinga, Coronel Fabriciano e Timóteo, municípios localizados a cerca de 54 km da casa.
15 de agosto - Um homem de 38 anos colocou fogo em um ônibus na cidade de Ferros, na microrregião de Itabira, na região Central de Minas Gerais. As chamas atingiram a rede elétrica, e os moradores ficaram sem luz. O homem foi preso.
As chamas foram contidas por moradores e servidores que trabalham na Prefeitura. Como o Corpo de Bombeiros mais próximo está localizado a cerca de uma hora, na cidade de Itabira, eles tiveram que usar extintores de incêndio, mangueiras de jardim, baldes e um caminhão-pipa. As chamas causaram diversas explosões na cidade.
15 de agosto - Um idoso de 63 anos morreu carbonizado após a casa dele pegar fogo no município de Luz, na região Centro-Oeste do Estado. Segundo informações do Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais, a equipe da corporação foi acionada até o local. Lá, verificaram que o fogo havia sido parcialmente controlado por militares da Polícia Militar (PM), com a ajuda de um caminhão-pipa da prefeitura da cidade. Os bombeiros fizeram as ações de rescaldo no lugar, assim como a vistoria da casa.
17 de agosto - Uma explosão ocorrida em uma fábrica de fogos de artifício deixou duas pessoas mortas no município de Santo Antônio do Monte, na região Centro-Oeste de Minas Gerais. O acidente ocorreu na zona rural da cidade. De acordo com informações do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), o pedido de socorro foi registrado às 8h. Quando chegaram ao local, os socorristas informaram que as duas vítimas já estavam mortas.
https://www.otempo.com.br/cidades/minas-gerais-tem-90-das-cidades-sem-uma-unidade-do-corpo-de-bombeiros-1.2717958
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