Publicado em 03/09/2018 - 16:41
Por Vinícius Lisboa - Repórter da Agência Brasil Rio de Janeiro
O material que o biólogo Paulo Buckup pesquisava há 22 anos no Museu Nacional estava resguardado em um prédio separado do palácio destruído pelas chamas na noite de ontem (2). Mesmo assim, o professor somou esforços aos mais de 30 servidores e voluntários que entraram no museu durante o incêndio para salvar alguma parte do acervo. Foram várias "viagens" para retirar o máximo possível, sob um teto que podia desabar a qualquer momento conforme o fogo avançava nos andares superiores.
"Eu pensei que eu podia morrer, mas [o museu] era a minha vida e a vida dos meus colegas. Aqui 'morreram as vidas' de muitos colegas. Vi funcionários aposentados que vieram aqui transtornados porque não só a vida de nossos ancestrais em pesquisa foi perdida, mas a vida inteira deles foi perdida. Muitos cientistas e técnicos entraram no Museu Nacional quando eram jovens e ficaram a vida inteira", lamentou.
Um incêndio atingiu, no começo da noite deste domingo (2), o Museu Nacional do Rio de Janeiro, na Quinta da Boa Vista, em São Cristóvão, na zona norte da capital fluminense - Tânia Rego/Agência Brasil
Paulo conta que decidiu entrar no museu quando viu que faltava água para o trabalho dos bombeiros no controle das chamas, que avançavam rapidamente. Outras pessoas tomaram a mesma decisão e conseguiram resgatar parte do material que não poderia ser recuperado.
"São grandes heróis. Tínhamos gente aqui desde a reitoria da UFRJ [Universidade Federal do Rio de Janeiro] até funcionários aposentados que assumiram grandes riscos", conta Buckup, que também viu voluntários e parentes de servidores. "Não faltaram braços para carregar o material para longe do fogo, o que faltou foi condição de entrar mais para dentro do prédio".
Exemplares insubstituíveis
Dentro de um museu com um acervo de 20 milhões de itens, escolher o que deveria ser salvo era uma decisão que apenas um pesquisador da área poderia tomar. Por isso, Paulo passou praticamente uma hora e meia tentando salvar os restos de moluscos que serviram de base para que espécies fossem descobertas e catalogadas. Para salvar os exemplares de moluscos, Paulo e seus colegas tinham que arrancar as gavetas dos armários e carregá-las para fora do prédio.
Acervo do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) - Tomaz Silva/Arquivo Agência Brasil
"Salvamos alguns milhares de exemplares insubstituíveis, mas isso não é nada perto dos milhões que existiam ali dentro", disse ele. "Inclusive existia a possibilidade de que espécies ainda não descritas existam nas coleções, e podem estar sendo perdidas antes de ser descritas".
Apesar de o material que Paulo pesquisa estar resguardado em outro prédio, com o acervo dos animais vertebrados, o departamento em que trabalha perdeu peixes que haviam sido separados para uma exposição que nem chegou a ser aberta. "São exemplares que não existem mais nesse tamanho na costa brasileira".
O pesquisador conta que, mesmo antes do incêndio, já precisava vencer o desânimo para tocar seu trabalho em meio aos cortes de recursos sofridos pelo museu. O biólogo conta que perdeu bolsistas que se mudaram para o exterior e trabalhava em uma forma de revigorar seu projeto, sobre a evolução dos peixes.
"Estou tentando mudar essa situação para que a gente possa manter as nossas coleções no Departamento de Vertebrados e, principalmente, a formação de novos cientistas para o Brasil. Esse museu é sede de seis pós-graduações e algumas de altíssimo nível".
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Edição: Lílian Beraldo
Agência Brasil
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