segunda-feira, 25 de julho de 2016

Desentendimentos entre Temer e Meirelles já começam a causar inquietação

Meirelles e Temer precisam se entender, pelo bem do Brasil

Vicente Nunes
Correio Braziliense

O governo de Michel Temer está deitado em berço esplêndido. Com o apoio escancarado do mercado financeiro, nada de concreto fez até agora para ajustar as contas públicas. A revisão bimestral de receitas e despesas, divulgada sexta-feira pelo Ministério do Planejamento, mostra que a gastança continua a todo vapor, engolindo as folgas que, estrategicamente, a equipe econômica colocou na monstruosa previsão de déficit para este ano, de R$ 170,5 bilhões. O espaço para acomodar mais despesas, porém, chegou ao fim, admite o ministro Dyogo Oliveira, do Planejamento.

O buraco tão grande nas finanças federais foi estrategicamente pensado. Como explica um técnico graduado da Esplanada dos Ministérios, o governo usou a folga fiscal para “comprar” o impeachment de Dilma Rousseff. Se não tivesse dado reajuste aos servidores, aberto mão de R$ 50 bilhões em dívidas dos estados, injetado quase R$ 3 bilhões nos cofres dos municípios e atendido todo tipo de pleito de deputados e senadores, certamente o presidente interino estaria hoje enfrentando uma séria ameaça de a petista voltar ao Palácio do Planalto.

ACABOU A FESTA – A situação fiscal é tão grave que o governo está queimando praticamente toda a reserva de R$ 18 bilhões prevista no rombo de R$ 170,5 bilhões. Não fosse esse colchão, o buraco nas contas seria de R$ 187 bilhões.

A saída, para manter a folga, seria o governo cortar R$ 20 bilhões do Orçamento, como propunha a equipe econômica. Mas a ala política do Planalto acabou vencendo a batalha e o contingenciamento foi engavetado. Agora, deixa claro o ministro do Planejamento, fecharam-se as portas para as estripulias. Se Temer aumentar alguma despesa, terá que passar a tesoura em outra ou pedir nova autorização ao Congresso para ampliar o buraco nas contas.

A equipe econômica ainda acredita no bom senso do governo. Mas a derrota do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, na disputa em torno do contingenciamento, acendeu o sinal de alerta.

A FORÇA DE PADILHA – Os técnicos da equipe econômica estão se perguntando até onde vai a força do ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, que vem transitando com desenvoltura na seara alheia. Ele tem feito questão de se contrapor a Meirelles publicamente, negando muitos dos projetos propostos pela Fazenda.

Padilha disse, com todas as letras, que não haveria cortes de gastos, apesar de o time econômico ter definido até o valor, e realmente não houve. E nada do que Padilha fala é de sua pura responsabilidade. Tudo é estrategicamente combinado com Michel Temer. O interino faz questão de ressaltar a importância e a força de Meirelles no governo, mas não quer um superministro. Por isso, escalou o chefe da Casa Civil para polarizar com o colega da Fazenda. Esse confronto é comum em todos os governos. Mas é importante que as decisões técnicas prevaleçam, principalmente num quadro de tanta gravidade.

O maior problema do país hoje é fiscal. O rombo das contas públicas está na base da inflação alta, da desconfiança dos agentes econômicos, da recessão, do desemprego, dos maiores juros do mundo.

SITUAÇÃO DELICADA – Portanto, é bom que Temer mantenha o juízo. Hoje, se ele desfruta de total apoio dos investidores, amanhã, poderá enfrentar uma onda contrária que lhe custará muito caro. Todos os últimos governos passaram por testes violentos. Muita gente ficou pelo meio do caminho. Meirelles sabe muito bem disso. Teve que manejar o Banco Central na crise mundial de 2008. Como fez o dever de casa direitinho, colheu os frutos. A recessão durou pouco. A inflação se manteve comportada, a ponto de permitir o corte da taxa básica de juros (Selic).

Muitos acreditam que o grande teste do governo Temer virá depois da aprovação do impeachment de Dilma pelo Senado, o que, se espera, deve ocorrer até o fim de agosto. A partir daí, o mercado cobrará medidas efetivas para o ajuste fiscal e a retomada do crescimento. Na visão dos investidores, a fatura da saída de cena da petista estará liquidada. Daí em diante, começará um novo jogo. E a complacência atual será substituída por muita expectativa. Se não entregar o que os donos do dinheiro esperam, o peemedebista verá o quanto o mercado é ingrato.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – A situação é preocupante. Sabe-se que Temer e Meirelles fazem um governo compartilhado, mas é o presidente que detém a caneta. Se os desentendimentos prosseguirem, o equilíbrio institucional termina. É aí que mora o perigo… (C.N.)

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