segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Vinte mil pessoas acompanham a cerimônia de beatificação de Padre Victor em Três Pontas

SÁB 14 NOVEMBRO 2015 19:40 ATUALIZADO EM SEG 16 NOVEMBRO 2015 00:00



Marcelo Di Carli

Cerca de 20 mil pessoas acompanharam, neste sábado (14/11), em Três Pontas, no Território Sul, a cerimônia de beatificação do Padre Francisco de Paula Victor, o primeiro ex-escravo do Brasil a se tornar beato. O evento, realizado no aeroporto do município, contou com a participação de representantes do Vaticano, fiéis de todo o país e autoridades estaduais. O secretário de Governo, Odair Cunha, prestigiou o ato representando o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel.

Mineiro de Campanha, Padre Victor – como ficou conhecido – teve a sua beatificação aprovada pelo Vaticano em junho deste ano, após uma mulher conseguir engravidar mesmo após a medicina afirmar que isso seria impossível. Em suas orações, a mulher pediu ao padre que intercedesse e realizasse o seu sonho de ser mãe, o que aconteceu em 2010.

A cerimônia foi aberta com o rito de beatificação, feito pelo prefeito da Congregação das Causas dos Santos, Cardeal Ângelo Amato, representante do Papa Francisco no ato. Em seguida, deu-se início a Santa Missa, presidida pelo Bispo da Diocese da Campanha, Dom Frei Diamantino Prata de Carvalho. Durante a cerimônia religiosa, os bispos presentes foram conduzidos ao altar para o ato penitencial.

Ainda durante o ato, a imagem oficial do beato foi apresentada, com os símbolos de sua origem e sua feição. Agora, a imagem poderá ter um lugar no altar da Igreja. A história de vida do beato também foi relatada durante o rito da beatificação.

Exemplo

A história de dedicação de Padre Victor aos mais necessitados, segundo Odair Cunha, é o maior legado deixado pelo religioso. O secretário representou o governador Fernando Pimentel na cerimônia. O governador retornou neste sábado a Governador Valadares ao lado do ministro da Integração Nacional, Gilberto Occhi, para acompanhar os trabalhos das equipes que monitoram a situação do rio Doce, atingidos pelos rejeitos das barragens Santarém e Fundão, em Mariana.

“Sua dedicação aos pobres, aos outros e o fato também de ser um negro, um escravo, faz com que nós tenhamos a oportunidade de reverenciar a vida e a história de tantos outros negros e negras anônimas que contribuíram para o crescimento do Sul de Minas, de Minas e do Brasil”, afirmou Odair Cunha.

O secretário ainda reforçou a importância para o crescimento e fortalecimento do turismo religioso no Estado. “Fico feliz com esse gesto da Igreja Católica faz com este mineiro da Campanha, que se notabilizou pelo seu trabalho, pela sua dedicação aqui na cidade de Três Pontas”, afirmou.

Já o padre Mateus Arantes, vigário paroquial da Igreja Matriz de Três Pontas e um dos líderes da organização do evento de beatificação, destacou a parceria entre o Governo do Estado, a Prefeitura e a Igreja na realização da cerimônia. “Nós estamos organizados e com o coração agradecido, porque evento é esperado há mais de 110 anos. Padre Victor morreu em fama de santidade”, destacou, ressaltando seus feitos por toda a região.

São muitas as histórias de devoção em torno do religioso por suas intervenções. O agricultor da cidade de Paraguaçu (Sul de Minas), Deni Vilela Prado, 54, viajou ao lado da mulher Vilma Santos Silva, 49, para prestigiar a beatificação de Padre Victor, considerado por eles como “um herói da Igreja Católica”. Eles afirmam terem sido atendidos pelo beato em diversos momentos. O mais importante foi a cura de uma grave trombose enfrentada por Deni há 11 anos.

“Fiz diversos tratamentos e não obtive a cura. Minha esposa pediu a Padre Victor que me curasse e eu alcancei essa graça. Estamos aqui para agradecer por esse milagre”, contou o agricultor. Segundo Vilma Santos, além dos feitos do agora beato, ele já é um exemplo por ter conseguido se destacar numa época em que os negros eram excluídos. “Ele é um herói, um servo de Deus. Viveu preconceitos e os superou”, completou.

A fé em Padre Victor também trouxe a Três Pontas Maria Aparecida Mira, de 67 anos, que mora em Cristina, também no Território Sul. “Sou católica e tenho muita fé em Padre Victor. Ele sempre está em minhas orações. É muito importante termos mais um beato mineiro”, ressaltou.

Dom Frei Diamantino Prata de Carvalho ressaltou em entrevista à imprensa que o mais importante nessas décadas de espera até a aprovação da beatificação foi a união e o trabalho das pessoas em torno da causa. “Eu poderia citar o poeta Fernando Pessoa que diz ‘tudo vale a pena quando a alma não é pequena’. O que importa é que nesses anos todos trabalharam com dedicação”, destacou, emocionado por ter podido participar desse momento histórico.

Também acompanharam a cerimônia os secretários de Estado de Turismo, Mário Henrique Caixa, e de Cultura, Ângelo Oswaldo, além de lideranças políticas e religiosas da região.

História

Padre Victor nasceu em Campanha no dia 12 de abril de 1827, filho da escrava Lourença Maria de Jesus. Em junho de 1849 foi aceito como seminarista em Mariana, algo incomum na época para jovens negros e escravos. Chegou a Três Pontas em 1852 e paroquiou por lá durante 53 anos, onde foi muito admirado e querido pela população por seu trabalho em defesa dos pobres e doentes.

O agora beato faleceu no dia 23 de setembro de 1905. Ficou insepulto três dias e, segundo relatos, seu corpo exalava perfume. Uma procissão foi feita pelas ruas de Três Pontas durante o seu sepultamento, que reuniu um grande número de pessoas. Os restos mortais de Padre Victor estão no sarcógrafo da Matriz D’Ajuda.

Beatificação

A beatificação é uma permissão de culto da Igreja Católica a uma pessoa considerada santa. A partir disso, ela pode interceder pelas outras pessoas. O processo de Padre Victor foi aberto em 1993. O primeiro passo foi encontrar documento que comprovaram a existência do padre, depois começaram a reunir relatos sobre suas histórias. Outra etapa foi a exumação do corpo. Após isso, uma comissão, em Roma, passou a analisar a história do futuro beato e buscar pelo milagre, reconhecido em junho de 2015.

Para que seja canonizado, é preciso que um novo milagre seja reconhecido pelo Vaticano. Assim, Padre Victor poderá ser cultuado em todo o mundo. A partir de agora, Padre Victor é o segundo beato do Sul de Minas. Em 2013, Francisca de Paula de Jesus, a Nhá Chica, foi beatificada em Baependi.

Agência Minas

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