18/12/2014 às 15:37
Luiz Inácio Lula da Silva, o Poderoso Chefão do PT, que já autorizou, por incrível que pareça, o lançamento de sua candidatura à Presidência para 2018, participou nesta quinta-feira de uma solenidade, no Ministério da Justiça, em homenagem aos dez anos da reforma do Judiciário e à criação do Conselho Nacional de Justiça. Discursou. Sabe-se lá por quê. Mas discursou. E afirmou o seguinte:
“Nesse momento em que se realizam investigações capazes de conduzir ao expurgo de práticas ilícitas de corruptos e corruptores, há setores que se lançam à manipulação da denúncia e ao vazamento seletivo de inquéritos com indisfarçável objetivo político-partidário (…). Pessoas e instituições investigadas tornam-se alvo de prejulgamento público sem acesso proporcional ao direito de defesa”.
Ulalá! Não se trata, à diferença do que parece, de uma defesa do Estado Democrático e de Direito. O que Lula faz é a defesa do seu partido e, na prática, de sua própria herança. A casa de horrores em que se transformou a Petrobras não é uma exceção à regra; estamos diante da exposição de um método e de um jeito de entender a coisa pública. Aliás, não falta apenas substância a esse discurso de Lula; faltam também os sensos de decoro e de ridículo. Fazer a defesa de uma tese em causa própria numa solenidade voltada à defesa da Justiça é só mais uma ação imprópria deste senhor, cuja atuação política nunca primou pelo respeito às instituições.
Segundo Lula, “setores partidários e da imprensa fazem tábula rasa de sagrados princípios do Estado de Direito”. Eis aí: trata-se de mais uma tentativa, a enésima, de intimidar a imprensa, buscando vincular o seu trabalho a uma forma de antipetismo. Ora, se, ao revelar os bastidores dos descalabros que atingem o país, o jornalismo esbarra em interesses do PT, e preciso que a gente apele à lógica para constatar: é o PT que está comprometido demais com os descalabros.
Essa não é, de resto, a fala típica de Lula. Esse texto meio pomposo deve ter sido redigido por algum estafeta. O dono do PT deve desconhecer o conceito de “tábula rasa”. Certamente não se referia a tertúlias herdadas de Platão e Aristóteles, atualizadas por John Locke. A Lula não interessa saber se o homem traz consigo ideias inatas ou se nasce oco de verdades, adquirindo-as ao longo da vida. Ele já deixou claro que especulações filosóficas lhe dão sono. Dorme até lendo livros do Chico Buarque — e, nesse particular apenas, como censurá-lo?
Lula, sim, construiu a sua carreira política fazendo “tábula rasa” dos que vieram antes. Ele, sim, procurou raspar a tábua das biografias alheias, para sobrepor ao antigo escrito a sua própria versão da história. Foi assim que inventou uma suposta herança maldita e cravou o bordão “Nunca antes na história deste país”, como se o Brasil tivesse sido descoberto e fundado pelo PT.
Lula reclama agora porque, com efeito, a sua herança maldita reduziu a Petrobras a um sexto do que ela chegou a valer no mercado. E, nunca antes na história deste país, se viram escândalos da magnitude do mensalão e do petrolão.
De resto, quem é Lula para reclamar do vazamento de investigações? Incrustado na máquina do estado e nos três Poderes da República, o PT sempre usou o acesso a informações privilegiadas sobre a vida dos indivíduos para fazer política e para defender os próprios interesses. Ou a quebra informal do sigilo bancário do caseiro Francenildo dos Santos Costa não restará para a história como o emblema da mobilização da máquina do estado contra um homem pobre que teve a má sorte de se ver em meio a um enredo macabro protagonizado pelo partido?
Esse Lula moralizador dos costumes, esse Catão de fancaria, não convence ninguém. O PT, sim, tentou manipular a história e está sendo desmoralizado pelos fatos.
Por Reinaldo Azevedo
http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/
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