DEPRESSÃO PÓS-PARTO
Heraldo Palmeira
Espírito de fodões: com tóis ninguém pode
A Copa do Mundo de 2014 ofereceu ao mundo o estilo de acolhimento dos brasileiros. Não restou espaço para ninguém se meter a dono da festa, para nenhum pateta comer superamendoim e tirar onda de superpateta.
O cartunista Ziraldo, eterno menino maluquinho, encheu o pé: “Está tudo num verso mínimo de Manuel Bandeira, nosso grande poeta: ‘Tão Brasil!’. Tudo que ia dar errado (merda) deu certo! Existe coisa mais brasileira que isso?”.
Pelo visto, o oposto também foi fato. Muito do que ia dar certo deu merda. A julgar pelas reclamações de hoteleiros, taxistas, comerciantes e até representantes de grandes shoppings, que viram o faturamento encolher. A julgar pela quantidade de obras de mobilidade urbana que ficaram incompletas, desmoronaram ou sequer saíram do papel.
Já se vibrou o suficiente com a vitória germânica. Também se tentou diminuir com argumentos risíveis a conquista dos campeões. Muitas viúvas ainda choramingam à míngua os quase gols hermanos de uma quase vitória que não veio.
Para falar de quase gol, melhor lembrar a pintura de Pelé contra o Uruguai na Copa de 1970. Um drible de corpo no goleiro Ladislao Mazurkiewicz passou à história da bola, por justíssima licença poética, como um dos gols mais bonitos de todos os tempos. Só ficou faltando a bola entrar trave adentro e beijar a rede. Sem contar que na súmula do jogo consta Brasil 3 x 1 Uruguai. Algo muito além de um reles Gonzalo Higuaín atordoado jogando fora um gol feito para um time que não fez nenhum outro. Portanto, esse papo de quase gol argentino já deu preguiça.
E nem devemos começar a conversa de campeão moral, porque o assunto morre na Seleção Brasileira na Copa de 1982. Que foi assassinada por um bonde chamado Cerezo. Não adianta: justo ou não, resultado é aquele que consta na súmula do jogo.
Já se disse tudo o que podia ser dito a respeito da morte por corpo mole da Seleção Brasileira, assassinada pela Geração Tóis, definitivamente amaldiçoada pelos deuses da bola e merecidamente execrada na história do nosso futebol. Foi um parto de ouriço atravessado que massacrou uma pátria-mãe subtraída de um sonho possível: o sexto filho.
Neymar, o Tóis-mor, deverá seguir seu rumo de Robinho passado a limpo pela turma do marketing – ou a ridícula entrevista ao Fantástico teve outra função a não ser tentar salvar o mascate da falência da loja de horrores de Felipão?
O Tóis-histriônico Dani Alves, filósofo da internet nas horas vagas, foi informado de que o novo técnico Luis Enrique está curiosíssimo para “conhecer suas aspirações” no Barcelona. Precisa apresentar correndo algo além do fashion-ridículo que adora ostentar.
O resto dos canarinhos sem penas seguirá arrastando pela vida a pena do silêncio de quem não sabe cantar. Nem voar.
A anunciada renovação do futebol brasileiro é a depressão pós-parto. Gilmar Rinaldi?! Dunga?! O jornalista Raphael Gomide escreveu: “Após o vexame brasileiro na Copa do Mundo, a CBF anuncia um agente de jogadores sem experiência internacional como coordenador de seleções”. O jornalista Reinaldo Azevedo completa a jogada balançando a rede: “Dunga é a contramão da modernidade; é o atraso orgulhoso, machão e, lamento muito, meio abestado”. O próprio Gilmar, depois da derrota para a Holanda e ainda defendendo a permanência de Felipão e sua “família” de chorões, deixou no Twitter uma boa pista do estilo que poderá pontuar a Era Dunga II: “…direcionar as coisas na direção certa”.
Agora, temos dois caminhos: contar com um milagre para ninguém direcionar as coisas na direção errada, ou escolher uma segunda seleção para torcer depois dos nossos apagões. E não custa lembrar que, antes de sonhar com técnicos estrangeiros de primeira linha, é bom ter em mente que eles sabem perfeitamente a roubada que é treinar a Canarinho. Ainda mais porque o ninho dela é essa CBF repleta de falcões.
O jornalista Fernando Gabeira liquida a fatura: “Podemos ser um país melhor. Antes teremos de perder esse espírito de fodões de que com tóis ninguém pode, vem quente que estou fervendo. Ele favorece os apagões, nas semifinais da Copa ou na noite de núpcias. Foi-se o tempo em que pensávamos que os alemães eram limitados porque eram apenas organizados e bem treinados. São tudo isso e têm talento. É a única combinação que leva à vitória ou, ao menos, a uma derrota honrosa”.
No mais, a seguir como está, ficaremos desfiando tangos e tragédias, apostando em milongas e jeitinhos, transformando jogos de futebol em partos de ouriços atravessados. E sofrendo de depressão pós-parto por quatro anos, de quatro em quatro anos.
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