sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Licenças médicas agravam redução no efetivo policial

08 de Novembro de 2013 - Juiz de Fora 

Necessidade de mais vigilância nas ruas foi alvo de manifesto de taxistas esta semana e levou prefeito a cobrar mais homens para as polícias em JF

Por Marcos Araújo


A necessidade do aumento do efetivo policial nas ruas de Juiz de Fora é consenso e levou até mesmo o prefeito Bruno Siqueira (PMDB) a cobrar mais agentes para o município esta semana, após o assassinato de um taxista, na noite da última segunda-feira. No entanto, o número de homens em atuação na segurança pública é ainda menor do que apontam as estatísticas, já que muitos estão afastados por motivos de saúde. O problema afeta unidades das polícias Militar e Civil em todo o estado. De acordo com dados da Associação dos Praças Policiais e Bombeiros Militares de Minas Gerais (Aspra), o percentual mensal de policiais militares afastados por estes casos gira em torno de 7% a 8%. Já na Polícia Civil, dados do Sindicato dos Servidores da Polícia Civil de Minas (Sindpol) apontam que o índice é de aproximadamente 30%. De acordo com a assessoria de comunicação da 1ª Delegacia Regional de Polícia Civil, atualmente, cinco servidores estão afastados. Já a assessoria de comunicação organizacional da 4ª Região de Polícia Militar (4ªRPM) informou que não conta com dados a respeito de policiais afastados do trabalho por motivo de estresse.

Conforme a Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds), por se tratarem de dados estratégicos, os números atuais do efetivo da Polícia Militar e dos militares que se aposentaram nos últimos anos em Juiz de Fora não podem ser divulgados. Entretanto, conforme levantamento da Tribuna realizado junto à Polícia Militar de Minas Gerais e à Polícia Civil, em 2012, Juiz de Fora possuía 1.778 militares, sendo 217 lotados no setor administrativo, resultando em um policial para cada grupo de cerca de 300 habitantes. Na Polícia Civil, havia 220 policiais, o que representa um agente para cada cerca de 2.400 moradores. A tensão do dia a dia compromete ainda mais o efetivo, que sofre com a falta de recomposição. Na Polícia Militar, por exemplo, os últimos concursos ocorreram em dezembro de 2012, com 160 vagas para soldados que começarão o curso em janeiro de 2014. Outro, ainda em andamento, foi realizado no segundo semestre desse ano para 130 cargos no setor administrativo.

Rotina estressante

Profissionais das duas corporações apontam como desafios o risco de morte e a falta de reconhecimento no trabalho. Entre os momentos mais críticos de suas atividades, eles apontam abordagens, confronto armado, perseguição, negociação com bandido, incursões noturnas e ocorrências em áreas consideradas violentas. A carência de viaturas é outro problema apontado pelos trabalhadores. Um PM lotado na 4ª RPM, que não terá o nome, idade e companhia na qual atua divulgados, falou sobre as dificuldades de seguir na profissão. "Quem está há muitos anos na PM olha para trás e vê que perdeu muito tempo para desfrutar da família e do lazer, em busca de progressão na carreira. É triste constatar que não recebeu valorização. Não temos preparo psicológico para lidar com isso", desabafa. O militar acrescenta que a sobrecarga de trabalho é outro fator que contribui para que a atividade seja considerada uma das mais estressantes pela Organização Mundial de Saúde (OMS). "Falta efetivo na PM, pois muitos estão se aposentando e poucos entrando, o que leva à sobrecarga. Quem estava no administrativo há 15 anos está sendo colocado na rua e se depara com o registro de ocorrência informatizado, com o qual não está acostumado. Também tem que aprender a lidar com outro tipo de violência e queixas de abuso de autoridade. Como ficaram muito tempo numa rotina interna, não sabem como tratar essa nova realidade, e isso gera estresse psicológico, ocasionando afastamentos do serviço."

'O senso comum aponta que o problema é da polícia'

O coordenador da Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Associação dos Praças Policiais e Bombeiros Militares de Minas Gerais (Aspra), subtenente Luiz Gonzaga, aponta que a função de policial é de natureza estressante, porque, quando o profissional sai para o trabalho nas ruas, conta com um risco iminente. "Não há policial com mais de três anos na corporação que não tenha um conhecido que tenha morrido em serviço ou em razão de estar trabalhando", observa, enfatizando que o maior motivo para o estresse é a ausência de segurança. "O que mais provoca inquietação é saber que sua ação, no dia a dia, que é tirar de circulação pessoas que estão no crime, não resulta efetivamente numa solução do crime e nem na diminuição da violência, porque temos um sistema de segurança pública que, se não está falido, caminha para a falência. Não temos um sistema de justiça que seja eficiente, não temos um sistema prisional eficaz e nem uma política de ações sociais que dê resultados. O caldo disso é uma violência generalizada que coloca todos em alerta permanente, e o policial, além da tensão da atividade, tem que lidar com a cobrança de resultado, pois quando se pontua que a segurança pública é ineficiente, o senso comum aponta que o problema é da polícia. Assim, se o Estado é ineficiente, a polícia é ineficiente e o profissional paga um preço por ações políticas."

Como a PM sempre atua no calor das ocorrências, deslocando-se para locais de risco em potencial, seus agentes sempre trabalham na corda bamba. "Isso provoca uma descarga de adrenalina que leva a um estresse no organismo do policial, resultando também no estresse mental que provoca desequilíbrio e demanda por apoio médico." Outro aspecto que contribui para essa situação, conforme o subtenente, é o tamanho da polícia. "Não temos efetivo para atender a demanda de prevenção que é diferente da demanda para registro de ocorrência. Se será realizado um evento, a sociedade solicita policiamento com antecedência para se prevenir. Essa necessidade não tem sido atendida, porque o Estado não tem efetivo. Então, deixa-se de atuar na prevenção, para fazer o registro do fato criminoso, colocando sempre o policial no seu limite, provocando uma situação que, em determinado momento de sua vida, o militar terá de procurar o apoio médico." Segundo a 4ª Região de Polícia Militar, os policiais contam com Núcleo de Atendimento Integral à Saúde (Nais), onde podem ser tratados por psicólogos do quadro de oficiais da saúde. Eles também contam com um plano de previdência com rede credenciada de psicólogos disponíveis. Na Polícia Civil, a assessoria de comunicação da 1ª Delegacia Regional informou que não existem programas de tratamento psicológico.

Risco aumenta com contingente escasso na Polícia Civil

Na Polícia Civil, os problemas se repetem e são relacionados à sobrecarga, cobrança e precárias condições de trabalho. Como aponta o Sindicato dos Servidores da Polícia Civil (Sindpol), uma situação grave vivenciada pelos policiais civis é a falta de armamento. Quanto aos coletes à prova de bala que também eram um problema, 84 unidades foram recebidas no município no final de outubro. Segundo o diretor do sindicato, Marcelo Armstrong, "o policial civil hoje trabalha com receio, pois não conta com armamento suficiente e sai para as ruas em viaturas em péssimas condições. Ele se encontra em uma posição muito frágil, sem contar a falta de efetivo, que faz um único servidor trabalhar por cinco", afirma, ressaltando que os profissionais ainda têm que lidar com o cumprimento de meta e o assédio moral por parte dos superiores. "Esses motivos repercutem no maior número de policiais afastados, pois eles tomam café da manhã, saem de casa e não sabem se voltam vivos."

Um agente que trabalha da Delegacia de Santa Terezinha e também terá seu nome preservado contou como a tensão faz parte da rotina dos policiais civis na cidade. Para se ter uma ideia, ele afirma que uma equipe completa é constituída apenas por dois agentes. "No momento de uma abordagem, isso pode ser um risco, já que nem contamos com rádio de comunicação na viatura. Se estivermos em uma situação de risco, não há como pedir socorro", enfatiza. Ele também acrescenta que é muito comum apenas um policial fazer a transferência de preso da unidade policial para os presídios. "O correto é ter três policiais para fazer o transporte de um preso. Entretanto, às vezes, acontece o contrário, um único agente vai na viatura com três prisioneiros." Ele ainda admite que os policiais têm que lidar com falta de munição e de equipamentos não letais, como spray de pimenta, arma de choque e balas de festim. "Isso aumenta os riscos e leva o policial a cometer atos desproporcionais nas situações de perigo, já que tem que proteger a si e à população, pois ele pode ser rendido, e o bandido ficar com sua arma." Para recompor seu efetivo, a fim de diminuir a sobrecarga de trabalho, a Polícia Civil abriu vagas para 293 escrivães em 2012. Todavia, apenas três foram lotados em Juiz de Fora. Em 2013, houve concurso para contratação de 866 técnicos assistentes, sendo que a região da Zona da Mata foi contemplada, até agora, com seis servidores. Também foram contratados 415 técnicos analistas, mas ainda não foram lotados. Em andamento, a corporação aguarda a finalização do processo para contratação de 121 médicos legistas, 95 peritos, 126 escrivães e 420 delegados.

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