12/12/2012 às 17:33
Por Reinaldo Azevedo
No post anterior, desconstruo a fala de Gilberto Carvalho com os fatos e com a lógica. É evidente que é descabido um ministro de estado emitir sentenças sobre questões que estão sendo apuradas e coisa e tal. Mas Carvalho, vá lá, comprometeu menos a sua função do que José Eduardo Cardozo, ministro da Justiça.
Obedecendo à orientação de Dilma — o governo tem de defender Lula —, também ele se pronunciou sobre as acusações de Valério. E fez uma lambança dos diabos. ATENÇÃO! CARDOZO FEZ CONFUSÃO NÃO PORQUE SEJA BURRO, MAS PORQUE NÃO É BURRO…
Leiam esta declaração:
“Um depoimento que é apresentado sem provas, por uma pessoa que estava envolvida em práticas criminosas, não tem significado jurídico. A menos que, obviamente, se mostre que o que ele falou é verdadeiro. Mas parece que não foram juntadas provas que minimamente pudessem dar credibilidade ao depoimento”.
“Um depoimento que é apresentado sem provas, por uma pessoa que estava envolvida em práticas criminosas, não tem significado jurídico. A menos que, obviamente, se mostre que o que ele falou é verdadeiro. Mas parece que não foram juntadas provas que minimamente pudessem dar credibilidade ao depoimento”.
Uau! É de trincar as catedrais da consciência jurídica nativa. É tal o baguncismo conceitual que há o risco de a explicação ficar mais enrolada do que o problema, mas acho que dá. Vamos ver.
Primeiro passo
Comecemos pelo fim da fala: “Mas parece que não foram juntadas provas que minimamente pudesse dar credibilidade ao depoimento”.
Comecemos pelo fim da fala: “Mas parece que não foram juntadas provas que minimamente pudesse dar credibilidade ao depoimento”.
Cardozo só pode estar se referindo ao processo do mensalão. E, com efeito, não foram juntadas provas sobre essas denúncias porque elas nem sequer existiam. Nada do que Valério diz agora foi investigado. As questões de que ele trata simplesmente não integram a tal Ação Penal 470. Cardozo recorre a um clássico da advocacia diversionista, que consiste em negar enfaticamente o que ninguém afirmou.
Segundo passo
Cardozo abre assim a sua fala: “Um depoimento que é apresentado sem provas, por uma pessoa que estava envolvida em práticas criminosas, não tem significado jurídico.”
Cardozo abre assim a sua fala: “Um depoimento que é apresentado sem provas, por uma pessoa que estava envolvida em práticas criminosas, não tem significado jurídico.”
Como, excelência?
O depoimento de Valério “não em significado jurídico” na Ação Penal 470 — alguém disse que tinha??? — PELA SIMPLES, ÓBVIA E CLARA RAZÃO DE QUE NÃO INTEGRA A AÇÃO PENAL 470!!! Quem vai avaliar se tem ou não — e vai submeter essa avaliação à Justiça — é o Ministério Público. E será o Poder Judiciário, NÃO O MINISTRO CARDOZO, que vai decidir se há ou não relevância jurídica no que diz o operador do mensalão.
Mais: que história é essa de que depoimentos de pessoas “envolvidas em práticas criminosas” não têm relevância? Quando se quis pegar o ex-governador José Roberto Arruda e a camarilha cleptocrata que o cercava, recorreu-se a quem? A alguma carmelita? Não! Ministério Público e Polícia Federal pinçaram justamente um membro da quadrilha, com o estatuto da delação premiada em mãos.
O que diz um bandido tem, sim, de ser levado em conta, não como expressão da verdade, mas como elemento a ser considerado na investigação.
Um professor de Direito e as provas
A política, para alguns, pode ser cruel. Cardozo é professor de Direito da PUC-SP. Será que não fica constrangido, um pouquinho que seja, diante de seus alunos? Releiam lá o que disse: o depoimento de Valério não tem significado jurídico “a menos que, obviamente, se mostre que o que ele falou é verdadeiro.” Ah, bom!
A política, para alguns, pode ser cruel. Cardozo é professor de Direito da PUC-SP. Será que não fica constrangido, um pouquinho que seja, diante de seus alunos? Releiam lá o que disse: o depoimento de Valério não tem significado jurídico “a menos que, obviamente, se mostre que o que ele falou é verdadeiro.” Ah, bom!
E como é que se fica sabendo se é verdadeiro ou não? Ora, investigando! “Mas, então, toda acusação, toda denúncia, merece ser investigada?” Não! Se alguém denunciar ao Ministério Público a existência de uma quadrilha especializada em roubar a alma dos brasileiros, não se deve levar a coisa a sério — a menos que seja uma metáfora (se é que me entendem…). Mas não cabe ao MP ou à Justiça investigar verdades ou delírios metafóricos.
Ao Ministério Público cumpre averiguar, num primeiro momento, se existem indícios, tímidos que sejam, de que pode haver verdade na denúncia — ainda que feita pelo pior dos bandidos. Se houver…
Lembro, diga-se, que, para oferecer uma denúncia à Justiça — a exemplo do mensalão — basta ao MP apresentar os indícios. Foi o que se fez no caso mensalão. Quando os ministros a aceitaram, em 2007, não estavam condenando os réus. A apresentação das provas propriamente veio em fase posterior.
Não, ministro Cardozo! As novas acusações de Valério não integram e não integrarão o processo do mensalão. Mas o MP não pode ignorar tudo o que sabe desse processo ao avaliar a denúncia para saber se prossegue ou não na apuração, PODENDO RESULTAR NUMA NOVA AÇÃO PENAL.
E não se trata, é evidente, de uma acusação tão despropositada como aquela da quadrilha que rouba almas…
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