sábado, 6 de outubro de 2012

2012, 2014… Ou: Lula começa a sair do mito para cair na história

06/10/2012 às 6:57


Nunca caí no erro — e o arquivo está aí — de considerar que eleições municipais são prévias da eleição federal ou mesmo estadual. Não são! Nesse particular sentido, o Brasil que vai para as urnas amanhã não antecipa tendência nenhuma. Ainda que o PT tome uma surra histórica, isso não significa que Dilma Rousseff corra especial perigo em 2014. Mesmo que o PSDB obtenha vitórias importantes, o possível pleito de Aécio Neves não sai necessariamente fortalecido. Eleições municipais e federais são domínios diferentes, com motivações também distintas. Não custa lembrar que, durante os oito anos de mandato de Lula, houve duas eleições na cidade de São Paulo (2004 e 2008) e duas eleições para o governo do estado (2006 e 2010). Mesmo com o forte apoio do Babalorixá de Banânia, o PT foi derrotado nas quatro oportunidades — no primeiro turno no caso dos pleitos estaduais. Lula e Dilma não venceram nos colégios eleitorais paulista e paulistano nas disputas pela Presidência.

Então essas eleições não têm importância nenhuma? Ao contrário! Têm uma importância gigantesca, sim, mas de outra natureza. Mostra que Lula está deixando de ser um mito para começar a entrar na história, o que só pode fazer bem a estepaiz… A trajetória das personalidades públicas costuma ter sentido contrário. Ocorre que os petralhas da academia, com a colaboração de boa parte da imprensa, resolveram antecipar a hagiografia lulista à biografia… O mito Lula começa a morrer. Como, em seu lugar, entra o homem, os erros se tornam, então, mais claros!

O eleitorado, como se vê acima, já não fazia o que Lula determinava quando ele estava na Presidência da República. Por que o faria agora? Ainda que a grande massa não tenha a exata noção dos domínios das três esferas da administração (municipal, estadual e federal), sabe o bastante para concluir que a presidente da República e um ex-presidente interferem pouco na gestão da cidade. Essa transferência de voto é bem mais difícil. Dados de eleições anteriores deveriam ter instruído a cobertura da imprensa — o que não aconteceu, com as exceções de sempre. Ao contrário: repetiu-se ad nauseam que, tão logo Lula entrasse para valer nas campanhas, o milagre se daria. E, no entanto, não se deu!

Há um risco concreto de o PT ficar fora do segundo turno em São Paulo pela primeira vez desde que se instituíram as duas jornadas. Em Porto Alegre, o candidato petista — com as bênçãos adicionais de Tarso Genro — será humilhado. Em Belo Horizonte, o risco de uma derrota é grande. Em Recife, então, Lula experimenta o seu maior vexame: viu Humberto Costa reduzido à quase condição de nanico. Um candidato do PSDB, que é um pequeno partido na capital pernambucana, pode disputar o segundo turno com o homem escolhido por Eduardo Campos.

“Reinaldo, se você mesmo escreve que são realidades locais que determinam as escolhas nos pleitos municipais, onde Lula entra nessa história?” Pois é… Em princípio, não deveria mesmo entrar em lugar nenhum! Mas ele fez questão de saltar para o centro do campo e bater a mão no peito: “Passa a bola pra mim, passa a bola pra mim…” Está usando a eleição de 2012 para tentar voltar ao topo da política, deixando claro quem manda.

Desta vez, mais do que quando estava na Presidência, ele transformou algumas disputas em questões pessoais, impondo, na base do dedaço, quem seria o candidato. Atuou assim em Recife e em São Paulo. E o fez na certeza de que o mito levaria uma enxurrada de votos para os seus ungidos; em vez disso, viu-se um homem feroz, pronto a satanizar os adversários do partido com aquela ladainha tosca do arranca-rabo de classes: ricos contra pobres…

Pela primeira vez desde que foi eleito presidente, os poderes do demiurgo estão sendo postos em xeque. E, não tem jeito, já foram derrotados pela realidade. A única esperança do PT para minimizar a derrota, que já está dada, é vencer em São Paulo. Se, no entanto, não conseguir nem mesmo passar para o segundo turno, aí não contará com aquele “mas” compensatório: “A gente se deu mal em várias capitais importantes, mas, ao menos…”

Concluindo
O que estou dizendo, em suma, é que boa parte do eleitorado está fazendo a sua parte ao resistir ao assédio moral de Lula — e, em muitos aspectos, de Dilma. Isso é extremamente positivo, reitero, porque evidencia que “O Mito” está a caminho da humanização — com todas as suas precariedades.

Para que isso que se verifica tenha algum efeito em 2014, será preciso que as forças de oposição criem uma narrativa alternativa, oferecendo aos brasileiros uma opção. Desconfio da quantificação que se fez por aí sobre o impacto do julgamento do mensalão nas intenções de voto. Influência há, seja qual for o número. E tudo isso por quê? Porque o STF ofereceu, enfim, uma narrativa daqueles fatos e daqueles dias. Aí o petralha tira as patas dianteiras do chão e afirma: “Está vendo? O Reinaldo admite que o tribunal atua como oposição!”. Uma ova! Eu admito, isto sim, é que os ministros que se prezam quebraram o encanto de uma farsa e passaram a chamar aqueles crimes por seus respectivos nomes no Código Penal.

Sem criar a sua própria narrativa, que enseja também um conjunto de valores, a oposição não vai longe em 2014, ainda que 2012 esteja sendo um ano bem ruim para o PT.
Por Reinaldo Azevedo

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