Publicado em 23 de maio de 2021 por Tribuna da Internet
Carlos Newton
Quando já se pensava que tivesse caducado o pacto pela impunidade entre os três Poderes, devido às manifestações dos bolsonaristas contra o Supremo e o Congresso, a realidade dos fatos nos demonstra que se trata apenas de uma cortina de fumaça, porque na prática prossegue a operação tripartite para deixar impunes os crimes de corrupção, lavagem de dinheiro, improbidade e prevaricação que atingem a administração pública brasileira como um todo.
Em 2020, quando o então ministro da Justiça, Sérgio Moro, denunciou as tentativas de o presidente Bolsonaro interferir na Policia Federal para blindar crimes dos filhos e de si próprio, houve um escândalo, o Supremo abriu um inquérito que até hoje não chegou ao final, porque o chefe do governo se recusa a depor, e não aconteceu rigorosamente nada.
MAIS INTERFERÊNCIA – Ao invés de o presidente puxar o freio, devido ao escândalo, ele fez justamente o contrário, ao convocar uma reunião no Planalto com a advogada Luciana Pires, que defende seu filho Flávio Bolsonaro, para que a Agência Brasileira de Inteligência e o Gabinete de Segurança Institucional encontrassem um meio de interromper as investigações.
Como novamente não aconteceu nada, o presidente de sentiu desimpedido para aumentar a interferência, mudou a direção da Polícia Federal, que agora age abertamente para inviabilizar a autonomia investigativa dos delegados, de forma a blindar completamente governantes, parlamentares e magistrados que têm foro privilegiado.
Reportagem de Camila Mattoso e Fábio Serapião, na Folha, mostra como o diretor-geral da Polícia Federal, Paulo Maiurino, propôs ao Supremo Tribunal Federal o fim da autonomia de delegados nas investigações de autoridades com foro especial, para facilitar a blindagem.
ARAS FAZ O MESMO – Por mera coincidência, é claro, o prevaricador-geral da União, Augusto Aras, tomou idêntica providência, ao entrar com uma ação no Supremo para barrar operações da Polícia Federal que não tenham passado antes pelo aval do Ministério Público.
Essas iniciativas do diretor Maiurino e do procurador Aras ocorrem justamente após a Polícia Federal abrir investigações contra o ministro Dias Toffoli, por venda de sentenças, e contra o ministro Ricardo Salles, por venda de madeira extraída ilegalmente da Amazônia, além do enriquecimento ilícito, que também atinge Toffoli, aliás, mas deve ser coincidência.
Detalhe importantíssimo: esses sinistros procedimentos de Maiurino e Aras atingem diretamente a própria autonomia do Supremo, pois as investigações de Toffoli e Salles foram autorizadas pelos ministros Edson Fachin e Alexandre de Moraes.
P.S. 2 – O mais incrível é que isso esteja acontecendo exatamente quando uma delegação da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) se encontra no Brasil para investigar o surpreendente afrouxamento das regras anticorrupção no país. É muita desfaçatez. (C.N.)