17/09/2017 10h39
Rio de Janeiro
Alana Gandra - Repórter da Agência Brasil
Maria Helena Alves Peçanha da Silva, 66 anos, e Vera Lúcia Pereira, 62 anos, não se conhecem, mas compartilham a mesma alegria. Depois de se submeterem a cirurgias de mastectomia devido ao câncer de mama, as duas tiveram a oportunidade de reconstruir gratuitamente os mamilos por meio de tatuagem, dentro da campanha Espelho, Espelho Meu. A iniciativa é do estúdio Kiko Tattoo e é realizada no Rio de Janeiro e em Miami (Estados Unidos), durante os meses de setembro e outubro, pelo segundo ano consecutivo.
O projeto faz alusão ao Outubro Rosa, campanha de conscientização iniciada em 1990, em Nova York, cujo objetivo principal é alertar as mulheres e a sociedade sobre a importância da prevenção e do diagnóstico precoce do câncer de mama. O símbolo do Outubro Rosa é um laço cor-de-rosa.
Vera Lúcia fez a cirurgia para retirada do tumor em 2014. Há um ano, ela voltou ao centro cirúrgico para reconstrução da mama. E, no início deste mês, participou da iniciativa para reconstrução da aréola mamilar por meio da tatuagem. Ela conta que não sentiu nenhuma dor. “Amei essa tatuagem. Você não sabe o quanto ela me fez bem. Ficou perfeita”, disse à Agência Brasil.
Segundo Vera, uma sobrinha viu a campanha na internet e foi a responsável pela inscrição. Foi ela também que levou Vera ao estúdio de tatuagem. “Há um ano, eu estava querendo fazer essa tatuagem, mas não tinha condições”.
Para Maria Helena, a tatuagem dos mamilos eleva a autoestima da mulher. “Achei ótimo. Ficou perfeito. O resultado está mais do que satisfatório”, disse. Ela conta que fez a cirurgia de retirada da mama há 23 anos. A médica que a atendeu reconstruiu o seio e refez cirurgicamente o mamilo que, com os anos, foi perdendo a tonalidade.
“Só ficou o formato, mas sem definição de cor”, explicou. Com a tatuagem feita agora, a aréola ficou do tamanho da outra e com a mesma cor.
Maria Helena disse que ficou sabendo da campanha pelo jornal e que entrou em contato com o estúdio para saber o que deveria fazer para ser atendida. Ela conta ainda que fez uma avaliação no dia 4 deste mês e que, no dia seguinte, já estava novamente no estúdio para fazer a correção do mamilo.
Para fazer a tatuagem reparadora gratuitamente, dentro da campanha Espelho, Espelho Meu, as mulheres devem ligar para número (21) 2438-4539 e agendar visita com hora marcada para conversar com o tatuador e marcar o procedimento, mediante disponibilidade de agenda e liberação médica.
Tendência
Na avaliação do mastologista Marcelo Bello, diretor do Hospital do Câncer 3 do Instituto Nacional do Câncer José Alencar Gomes da Silva (Inca), a reconstrução dos mamilos por meio de tatuagem, em vez da cirurgia tradicional, tem sido uma tendência. “Hoje tem uma tatuagem que eles chamam tatuagem 3D e quando você olha, nem diz que aquilo não é um mamilo. É uma coisa que tem ganhado muito espaço, até pela facilidade, pela simplicidade que é o método.”
De acordo com o especialista, é um processo praticamente sem dor já que a tatuagem é feita em cima de uma área de sensibilidade reduzida por causa da cirurgia anterior. “Diversos mastologistas estão encaminhando [pacientes] para fazer a tatuagem. É muito mais simples. Não é um procedimento cirúrgico, não tem nenhuma contraindicação”, reiterou.
Solidariedade
Responsável pela campanha Espelho, Espelho Meu, Kiko faz a reconstrução de mamilos em mulheres que tiveram câncer por meio da tatuagem - Divulgação
Solidariedade e preocupação com o bem-estar do próximo movem os profissionais que decidem dar um pouco do seu tempo e do seu talento às mulheres que passaram por mastectomia.
Responsável pela campanha Espelho, Espelho Meu, o tatuador Kiko disse que iniciativa foi surgindo aos poucos. “A tatuagem nada mais é do que você descobrir artisticamente o que aquela pessoa quer demostrar na sua pele e você traduz aquilo em forma de um desenho ou em forma de arte.”
Ele conta que recebeu a visita de uma pessoa que queria colocar um desenho no lugar na aréola. “Aí, eu pensei, por que a gente não faz uma aréola de verdade?”.
O resgate da autoestima das mulheres é, segundo Kiko, o objetivo principal da campanha. “Decidimos fazer a campanha porque vimos que seria muito importante fazer essa colaboração que é muito ínfima, de 30 minutos”.
A ideia é beneficiar o maior número de mulheres possível. “Eu tenho certeza que isso vai mexer com a vida de muita gente e que não vai parar por aí. A gente pretende atender o máximo de mulheres nos meses de setembro e outubro, mas é bem possível que isso se estenda”, adiantou.
Ele espera que a campanha sirva de inspiração a outros profissionais. “Acho que podem contribuir muito. Espero que sirva de inspiração para outras pessoas, porque são muitas mulheres que necessitam dessa ajuda para superar ainda mais essa etapa [pós-mastectomia].”
Outras campanhas
O artista plástico e tatuador Miro Dantas criou, em 2014, em São Paulo, a campanha Uma Tatuagem Por Uma Vida Melhor para a reconstrução de mamilos de mulheres que tiveram câncer de mama. Segundo ele, 167 sete mulheres de todo o país foram atendidas, gratuitamente, praticamente uma por semana. “Veio gente do Brasil inteiro. Foi uma campanha bem legal”, disse Dantas à Agência Brasil.
De acordo com o tatuador, o procedimento já existe há algum tempo no mundo, mas como projeto social, ele acredita ter sido o pioneiro no país.
Em Belo Horizonte, a tatuadora Renata Espinelly cobre as cicatrizes das cirurgias de mastectomia com desenhos artísticos. Ela conta que começou esse trabalho em 2015. “Eu forneço duas tatuagens gratuitas no mês para homens trans e para mulheres que sofreram perda da mama por causa do câncer”, diz Renata que também atende no Rio de Janeiro e em São Paulo. As mulheres que a procuram, em geral, são muito tímidas, mas após a tatuagem se sentem melhores. “Levantar a autoestima delas é muito bom”.
Edição: Lílian Beraldo
Agência Brasil