Caetano, de cacique, também exigiu a volta do Ministério
Daniel Carvalho
Estadão
Auxiliares do presidente em exercício, Michel Temer, dizem que o recuo que transformou a Secretaria Nacional de Cultura em Ministério da Cultura se deveu à pressão da classe artística e não da classe política. Nomes como o ex-presidente José Sarney, criador da pasta em seu governo, e do presidente do Senado, Renan Calheiros, ambos do PMDB, estavam pressionando.
De acordo com interlocutores de Temer, ele quis demonstrar que, “ao contrário do governo anterior”, sua gestão está aberta ao diálogo e não é “intransigente”.
O recuo foi acertado na manhã deste sábado, 21, em conversa por telefone, já que Temer está em São Paulo e Mendonça Filho, ministro da Educação, pasta à qual a Secretaria de Cultura ficaria atrelada, está no interior de Pernambuco.
Inicialmente, Temer era contra o recuo para evitar pressão de outros setores para que o mesmo ocorresse com antigos ministérios que, na atual gestão, foram transformados em secretarias.
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POR QUE UMA SECRETARIA SERIA SUFICIENTE?
Ramiro Batista
Comunicação & Poder
Possivelmente para debelar algum tipo de disputa política na Nova Iorque dos anos 30, o prefeito que virou nome de aeroporto, Fiorello LaGuardia, disse que não havia uma forma de direita ou de esquerda de varrer rua. “Existe a forma correta”. Também não sei se existe uma forma de direita ou de esquerda, conservadora ou progressista, de estruturar um organismo público de preservação e fomento dos bens culturais do país. Deve existir uma forma correta.
De que tamanho? Com que objetivo? Quais seus limites? Secretaria enxuta de definição de políticas ou Ministério superestruturado para atender demandas da indústria do entretenimento?
O problema é que não parece haver ninguém habilitado a responder, a começar pelos artistas.
NÃO É COISA DE ARTISTA
Como na frase famosa de que guerra é assunto muito sério para ser entregue a generais, parece que a discussão sobre as dimensões de um órgão como esse é assunto muito sério para ser entregue a artistas.
Porque não vi uma argumentação convincente em toda a polêmica que se arma nas invasões e nas redes sociais contra a transformação do Ministério numa pasta vinculada ao Ministério da Educação, como foi até 1985.
A defesa de figurões respeitáveis como Marieta Severo, Fernanda Montenegro ou Caetano Veloso não passa de chavões, tenta luta política para desqualificar o governo que julgam ilegítimo ou, num maior esforço de argumento, que se trata de um retrocesso à data em que foi criado, há 30 anos.
SERIA INTOCÁVEL
Por esse raciocínio dos artistas, o que foi criado não pode ser extinto e basta uma existência para justificar uma continuidade, mesmo que não sobrevivam mais os motivos que gerou. Mesmo que funcione mal, seja deturpado ou, como parece ser o caso, mal se sabe explicar para que serve.
Não tenho dúvidas de que é necessário uma estrutura de serviço público para garantir a preservação do patrimônio histórico e artístico — museus, monumentos, bens imateriais — e estruturar planos e projetos de estímulo à produção de entretenimento cultural, da mesma forma que existe para estimular a produção de soja, roupas e máquinas.
Quando trabalhei na Secretaria de Estado da Cultura, entre 1985 e 87, uma diretora de Planejamento muito brilhante horrorizou a classe artística ao defender que o Estado deveria pensar estruturalmente sobre suas prioridades de fomento na área de cultura da mesma forma que as definia para estimular a produção de leite, carne e minério de ferro.
CLIENTELISMO
A diretora de Planejamento queria dizer que o Estado não poderia ficar refém das demandas dos que tinham acesso ao balcão da Secretaria para conseguir patrocínio a seus projetos. Um clientelismo tal e qual o dos fazendeiros que tomam dinheiro do Banco do Brasil, pulveriza os recursos e prejudica o investimento numa política de investimento de fato abrangente e democrática.
Como no caso do BNDES nos anos Lula e Dilma: ao invés de o Estado definir em que áreas convém investir — tecnologia, infraestrutura ou turismo —, fica apagando incêndios localizados para atender demandas de balcão.
O atendimento por demanda e não políticas de Estado cria distorções como a do excesso de filmes produzidos ou espaços construídos sem público.
ALGUNS EXEMPLOS
Por um bom tempo no início dos 2.000, 1/3 dos filmes financiados com verba pública não conseguiram exibição, como se o ministro da Educação jogasse pela janela 1/3 da verba de merenda escolar.
Por conta do lobby pesado da indústria cultural, Belo Horizonte ganhou nos últimos anos quase um dezena de grandes teatros e centros culturais para os quais não há suficiente demanda, nem de espetáculos de qualidade e nem público, na mesma área nobre onde há décadas se pede por um posto de saúde ou uma delegacia de polícia decentes.
INDÚSTRIA E COMÉRCIO
Nessa linha, considerando a atividade cultural um ramo da produção tão importante como a de laranja, carne processada ou software, ela poderia estar, quem sabe?, no Ministério da Indústria e do Comércio. Seus bens culturais abertos à visitação pública, como igrejas, parques e museus, poderiam estar num Ministério mais agressivo como o do Turismo, por exemplo.
Considerando que seja destinado a apenas definir as grandes políticas que estimulem o setor — Precisamos de teatros? Precisamos normatizar o financiamento? Precisamos criar incentivos à aquisição de obras de arte ou a produção de filmes e peças de teatro? —, uma Secretaria enxuta deve bastar.
(artigo enviado pelo comentarista Wilson Baptista Jr.)