23/11/2012 às 7:01
Por Reinaldo Azevedo
Escrevo na home um texto explicando por que o ministro Joaquim Barbosa, queira ele ou não, representa o triunfo dos valores democráticos. Mas, às vezes, acredito que ele próprio precisa se convencer disso. Segue um texto publicado hoje na Folha. É, de várias maneiras, lamentável. Leiam. Volto em seguida.
Barbosa faz crítica a pergunta feita por jornalista negro de TV
Descontente com uma pergunta feita por um repórter negro, o novo presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Joaquim Barbosa, disse anteontem que o questionamento reproduzia estereótipos repetidos por jornalistas brancos. “Eles [os demais jornalistas presentes no momento da frase, brancos] foram educados e comandados para levar adiante esses estereótipos. Mas você, meu amigo?”, disse Barbosa.
O jornalista Luiz Fara Monteiro, da TV Record, havia perguntado a Barbosa se ele estava “mais tranquilo, mais sereno” após a primeira sessão presidindo a corte. O relato foi publicado no mesmo dia no “Blog do Noblat”, do jornal “O Globo”. Barbosa falava para um grupo de repórteres em “off”, jargão jornalístico para designar informação em que a fonte se mantém anônima. Com a divulgação no blog do diário carioca, a Folha avaliou não haver mais o compromisso de preservar o “off”.
ESTEREÓTIPO
“Nesses dez anos, o ministro Joaquim botou para quebrar aí, quebrou as cadeiras? Gente, vamos parar de estereótipo, tá?”, queixou-se Barbosa, segundo o blog. “Logo você, meu brother!”, disse então ao repórter. “Ou você se acha parecido com a nossa Ana Flor [repórter da agência Reuters, que é branca]? A cor da minha pele é igual à sua. Não siga a linha de estereótipos porque isso é muito ruim. Eles foram educados e comandados para levar adiante esses estereótipos. Mas você, meu amigo?”.
“Nesses dez anos, o ministro Joaquim botou para quebrar aí, quebrou as cadeiras? Gente, vamos parar de estereótipo, tá?”, queixou-se Barbosa, segundo o blog. “Logo você, meu brother!”, disse então ao repórter. “Ou você se acha parecido com a nossa Ana Flor [repórter da agência Reuters, que é branca]? A cor da minha pele é igual à sua. Não siga a linha de estereótipos porque isso é muito ruim. Eles foram educados e comandados para levar adiante esses estereótipos. Mas você, meu amigo?”.
Procurada para falar sobre o assunto, a assessoria de Barbosa disse que o ministro não iria comentar.
Voltei
Tendo acontecido tudo dessa maneira, trata-se, e não tenho outra palavra para empregar, de uma reação detestável do ministro Joaquim Barbosa. Vejam como sou: quando acho que devo, elogio; quando acho que devo, critico.
Tendo acontecido tudo dessa maneira, trata-se, e não tenho outra palavra para empregar, de uma reação detestável do ministro Joaquim Barbosa. Vejam como sou: quando acho que devo, elogio; quando acho que devo, critico.
O ministro incorre em dois erros graves — e ambos teriam uma marca racial de cor de pele fosse raça. Quer dizer, então, ministro Barbosa, que todos os jornalistas brancos foram “igualmente educados e comandados” para ter uma determinada reação? Quer dizer, então, ministro, que cor de pele, agora, é destino e determina o pensamento? Quer dizer, ministro, que os brancos, nesse particular, não têm divergências?
Da mesma sorte, Vossa Excelência está a dizer que os negros todos hão de ter uma pauta e pensar em bloco porque, afinal, negros? O que o senhor censurou exatamente no repórter Luiz Fara Monteiro? Não ter feito uma pergunta “digna de um preto”?
Diga-me cá, ministro Barbosa: Vossa Excelência acredita que um preto deva entrevistar outro como preto? O mesmo deve valer para os brancos? No caso de uns e outros entrevistarem os que não são da sua cor, deve-se fazer entrevista ou dar início a uma guerra racial, ministro?
É provável que o repórter da Record tivesse em mente o temperamento algo abespinhado de Vossa Excelência — que, mais uma vez, se evidenciou nesse episódio lastimável. Será preciso lembrar aqui as muitas vezes em que o ministro ultrapassou a linha, o que o obrigou até a se desculpar com colegas?
Ora, ministro Joaquim Barbosa! Seu antípoda no julgamento, Ricardo Lewandowski, apanhou bastante de alguns jornalistas — neste blog, então, nem se fale… Terá sido porque é branco, porque se chama Lewandowski, porque é católico, porque morou em são Bernardo, porque…?
Noto, ademais, que o ministro falou ao repórter de “negro pra negro”, apartando-se dos brancos e censurando o seu “brother” porque não estaria apartado o bastante. O que ele pretende? Que Luiz Fara Monteiro seja primeiro negro e depois repórter? De Barbosa, espero que seja primeiro juiz e depois negro. Até porque, que eu saiba, suas decisões também afetam a vida dos brancos, dos mestiços, dos amarelos, dos vermelhos…
Barbosa deveria se desculpar com os jornalistas brancos. Barbosa deveria se desculpar com o jornalista negro. Ele preside o Supremo Tribunal Federal. Não é juiz de um tribunal racial.
Lamento muito ter de escrever isso. Mas lamento muito mais o que me levou a escrever isso.